sábado, 23 de maio de 2015

O DIA EM QUE A POLÍCIA AJUDOU O LADRÃO

                                          Mario: desespero de barriga vazia  


     Mario não tem trabalho fixo há onze meses e cuida sozinho do filho de 12 anos. Parece engolido por uma maré de infortúnios. Eletricista, ele perdeu o emprego com carteira assinada depois que a mulher sofreu um acidente grave e ficou internada por oito meses, em coma. Mario acompanhou o martírio de perto, diariamente. Com a alta médica, outra perda. A esposa, sem dinheiro, deixa o hospital e decide ir direto para a casa de outro filho, de outro casamento, para se recuperar das seqüelas. Abandonado, Mario vive de bicos, mas há dois meses não consegue nada. Sua rotina tem sido cuidar do garoto, que vai à escola de manhã.

     A geladeira está vazia. O último sinal de comida na casa é o saco de papel de um pão francês que o filho comeu antes de sair. Mario não come nada há dois dias. É inicio de mês, e ele vai, então, ao supermercado comprar banana, pão e carne. Na hora de passar no caixa, sabe que é insuficiente o valor que tem no bolso, 7 notas. Resolve esconder o pacote com dois quilos de carne na bolsa. As compras custavam 26 notas. Ele disfarça, mas as câmeras de segurança flagram o ato, aquele impulso que em segundos o transformou em ladrão. O dono do estabelecimento não aceita as explicações, chama a polícia e Mario é detido por tentativa de furto. Na delegacia, o homem passa mal ao saber que ficará preso, com fiança estipulada em 270 notas. Desmaia. Reanimado, conta sua história aos policiais e afirma que o filho ficará sem ter quem o cuide em casa. "A pior coisa que existe na vida é não poder alimentar o próprio filho", lamenta.

     O depoimento muda o ambiente na delegacia. “Dei-lhe 30 notas para pagar a carne e fui contar aos colegas o que estava acontecendo no plantão. Ficou todo mundo comovido, e logo um tirou 5 notas, outro 10, outro 20”, relata o policial civil. Uma agente paga sozinha a fiança. “A gente sabe que furtar não é certo, mas imaginei a minha filha passando fome. O que eu não faria nessa situação?”, especula. Quatro policiais levam Mario ao supermercado e compram arroz, feijão, macarrão, biscoito e outros produtos. Ao passar pela gôndola de higiene, um agente pergunta se ele tem pasta de dentes. Mario diz que não escovava os dentes com pasta havia um mês. “Pedimos que ele pegasse, então. Ele voltou com a menorzinha e mais barata. Brincamos, isso não dá nem para um dia, e pegamos logo cinco tubos, compramos sabonete e todo o resto”, conta outro policial. Mario é levado para casa. Diz não acreditar. Pede desculpas, não para de agradecer.
     
     Termina aqui a ficção.

     É tudo verdade. Mario é Mário Ferreira Lima, morador no planalto central, em Santa Maria, Distrito Federal. Eletricista desempregado preso após furtar dois quilos de carne para alimentar o filho em 12 de maio, ele recebeu ajuda da polícia após depoimento na 20ª delegacia do GamaOeste. Em 18 de maio, é contratado com carteira assinada pela Gois, empresa de construção civil de Valparaíso de Goiás. Salário: R$ 1.300, bem mais que os R$ 70 do Bolsa Família, programa social do governo. Como recebeu muitos alimentos depois que virou manchete, prometeu fazer cestas básicas e doá-las, porque “tem gente precisando”. Mário revelou a reação do filho. “Ele ficou triste. Eu pedi desculpa. Ele disse que sou tudo o que ele tem, e que não vai tomar como exemplo o que fiz.”.

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