quinta-feira, 9 de julho de 2015

DILMA, SEM DESTINO 2 [PEDALADAS]



Dilma pedala diante da Lava Jato Planalto: coincidência
       
           Despencando nas pesquisas, a presidente Dilma Rousseff pôde sentir bem a diferença no clima político e econômico do país: foi no mês passado, durante os recentes rolés que deu sobre duas rodas [no caso, bicicleta] para além dos jardins do Palácio da Alvorada, em Brasília. Ela deve sentir saudade daquele 8 de agosto de 2013, quando o cenário era outro: Dilma estava com popularidade alta no momento em que, ao melhor estilo "easy rider" [ou "sem destino"], colocou o capacete e passeou, às escondidas, pelas avenidas da capital federal na garupa da mítica motocicleta norte-americana Harley Davidson, pilotada pelo ex-ministro da Previdência Carlos Gabas. A inflação de julho daquele ano fechara em 0,03% [em 12 meses era de apenas 6,5%, abaixo da meta de 6,7%] e, no câmbio comercial, o dólar valia R$ 2,31. Dilma surfava nas pesquisas. E naquela voltinha "rebelde" de moto, que surpreendeu a segurança palaciana, ela parecia buscar um instante de descontração, escapar, por alguns minutos que fosse, da formalidade do cargo [clique abaixo no link Dilma, Sem Destino].

          Três meses depois, em novembro de 2013, um ano antes da reeleição, a presidente tinha 47% das intenções de voto, contra 19% de Aécio Neves e 11% de Eduardo Campos. Ainda não havia o noticiário diário sobre a vigarice de mão grande instalada na direção da Petrobras, que envolveu outras legendas [inclusive da oposição, embora a operação Lava Jato tenha esguicho de limpeza com foco único]. As acusações de corrupção colossal ainda não haviam manchado a bandeira do PT, que no poder mostrou-se em muitas coisas igual aos partidos que sempre criticou, com práticas que envergonharam seus militantes e frustraram milhões de eleitores.
    
          Agora, quando a presidente Dilma resolveu andar de bicicleta nos arredores do Alvorada, no início de junho último, e sair do "estado de sítio" em que se encontrava, a sua popularidade já havia caído drasticamente -- e a inflação [em alta] hoje empata com a porcentagem de brasileiros que consideram seu segundo mandato ótimo e bom: apenas 9%. O dólar estourou faz tempo a barreira dos R$ 3, é negociado hoje a R$ 3,23. O ex-ministro Guido Mantega errou feio. "Quem apostar no dólar a R$ 3, vai quebrar a cara", disse antes de sair do governo no fim de 2014. Houve outros erros, crassos.
       
         Com capacete, óculos escuros, luvas, calça legging e jaqueta esportiva, Dilma chegou a pedalar fora do Palácio da Alvorada por cerca de meia hora sem ser reconhecida, acompanhada por seguranças. Enfim, ela saiu do casulo [onde se escondia das vaias] 15 kg mais magra, após aderir a uma dieta rigorosa que segue desde que se reelegeu no fim de 2014. Como a moto, a bicicleta é  norte-americana. Trata-se de um modelo da marca Specialized desenhado para o corpo feminino,  muito confortável, que ajuda Dilma a manter a boa forma. Com aro 26 e 21 marchas, ela é indicada tanto para pequenas voltas pela cidade quanto para trilhas na natureza, segundo o fabricante. Custa R$ 2.900. Já uma Calói, modelo Aluminum Sport, com mesmo aro e marchas, sai por R$ 600.

          Mas não foram essas pedaladas da presidente que ficaram famosas. As "pedaladas fiscais" é que ganharam notoriedade. E que ameaçam derrubar a presidente.“Não vou, não vou, não caio, não caio”, disse Dilma. “Não há provas de que eu fiz algo errado nas contas. Não fiz nada que não tenha sido feito antes. Também não pus a mão em dinheiro sujo".
     
        "Pedaladas" é o nome dado a manobras contábeis que o governo teria usado para cumprir as suas metas fiscais. O Tesouro Nacional teria atrasado repasses para bancos públicos e privados que financiam despesas do governo, entre elas verbas do Bolsa Família, do abono e seguro-desemprego e subsídios agrícolas. Os beneficiários só receberam em dia porque os bancos assumiram, com recursos próprios, os pagamentos dos programas sociais. Com isso, a dívida do governo com os bancos cresceu. Segundo processo aberto no Tribunal de Contas da União (TCU), cerca de R$ 40 bilhões estiveram envolvidos nessas manobras entre 2012 e 2014, em tese ferindo a Lei de Responsabilidade Fiscal. O governo alega que essa é uma “prática antiga”, registrada também no governo FHC, e que as “pedaladas fiscais” não representam operações de crédito propriamente ditas -- ou seja, o governo não emprestou dinheiro dos bancos para fechar suas contas. Teria sido como quem atrasa um aluguel.

       O TCU não pode reprovar as contas do governo, mas pode enviar parecer ao Congresso. que faria o julgamento político da ação do governo. O parecer deve passar pela Comissão Mista de Orçamento e, depois, ser votado nos plenários da Câmara dos Deputados e do Senado. Se as contas forem rejeitadas, coisa que nunca aconteceu antes, a presidente Dilma pode aí sofrer processo de impedimento -- o grande desejo da oposição que, derrotada nas urnas, busca um argumento legal para encurtar o mandato da petista, sem que isso pareça um golpe.

       Para não cair da bicicleta, todo mundo sabe, pedalar é preciso. No caso da presidente Dilma: para não cair, governar é preciso, pedalar não é preciso. Ter um rumo é [mais que] necessário, não ser uma "easy rider" é imperativo.


DILMA, SEM DESTINO
[crônica publicada em 28 de agosto de 2013]



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