segunda-feira, 29 de julho de 2013

A ÁRVORE QUE CAI E O BOSQUE QUE CRESCE

     

      O papa Francisco ganhou a simpatia popular antes mesmo de abrir a boca no Rio de Janeiro. A empatia começou já na chegada, usando no cortejo um carro simples, com vidros abertos, beijando crianças, acenando para a multidão em delírio, quebrando os protocolos de segurança -- que ficaram mais rígidos após o papa João Paulo II sofrer um atentado em maio em 1981 [JP sobreviveu a dois tiros de revólver de baixo calibre dados por um jovem turco de 23 anos], em plena Praça de São Pedro, no Vaticano.

      Francisco surpreendeu ao defender abertamente a rebeldia dos jovens ("sejam revolucionários", pela ótica cristã), a necessidade de reforma na Igreja Católica, com uma proximidade maior com o povo (para estancar a perda de fiéis), e a simplicidade contra a ostentação. Tem mais: no voo de volta a Roma manifestou-se contra a marginalização dos homossexuais (embora desaprove o ato gay). E admitiu ainda que a Igreja, "como qualquer outra organização", comete erros [vide os escândalos financeiros e a pedofilia em seus quadros] e acertos, mas que ela deve dar o exemplo. "Faz mais barulho uma árvore que cai do que um bosque que cresce", disse.
     
       Francisco tem literalmente toda a razão. Antes de sua chegada ao Brasil, não só uma árvore caiu: 334 árvores centenárias foram derrubadas, na surdina, em reserva tombada de Mata Atlântica, por integrantes da Paróquia de São Sebastião de Itaipu, em Niterói. O crime ambiental repercutiu. Ali estava prevista uma missa campal para 800 peregrinos. Claro [durma-se com um barulho desse, de madeira caindo], o evento com a presença do papa acabou não acontecendo. O caso em si terminou em pizza: multa de R$ 10 mil e a promessa de replantio.

      A seguir, sete significativas declarações do papa Francisco que ficaram depois que ele se foi. São temas que, de uma forma ou de outra, tratam do dilema (de vida ou morte lenta) da Igreja Católica:

       "Um jovem que não protesta não me agrada. Porque o jovem tem a ilusão da utopia, e a utopia não é sempre ruim. A utopia é respirar e olhar adiante. O jovem é mais espontâneo, não tem tanta experiência de vida, é verdade. Mas às vezes a experiência nos freia. E ele tem mais energia para defender suas ideias. O jovem é essencialmente um inconformista"
        [sobre o alto índice de jovens desempregados na Europa e as manifestações de jovens no Brasil]

       "A Igreja precisa de reformas, há coisas que serviram no passado e agora não servem mais. A Igreja precisa ser dinâmica"
         [sobre mudanças na Igreja Católica, a partir deste ano, sem revelar quais e o teor delas. Sabe-se que o divórcio será um dos temas]

         "Nosso povo exige pobreza dos padres. Não é um bom exemplo um padre ter um carro de último modelo, de marca"
           [sobre o fato de andar em carros simples e o exemplo que os padres devem dar]
    
         "Para mim é fundamental a proximidade da Igreja. Porque a Igreja é a mãe. Nem eu nem você conhecem uma mãe por correspondência. Uma Igreja ocupada por mil coisas, que se descuida da proximidade e só se preocupa com documentos, é como uma mãe que fala com seu filho por cartas''
          [sobre a perda de fiéis da Igreja Católica para outras crenças] 
   
       "Antes de viajar, fui ver o papamóvel e ele estava com vidros. Se você quer fazer amigos, se comunicar, vai visitá-los em uma caixa de vidro? Não dá pra visitar um povo com esse grande coração em uma caixa de vidro"
       [sobre sua atitude de permitir a proximidade com os fiéis em sua visita ao Brasil]

        "Faz mais barulho uma árvore que cai do que um bosque que cresce"  
         [sobre escândalos na Igreja, que, diz ele, também comete erros; e os erros da Igreja aparecem mais]
          
         "Se uma pessoa é gay e procura Deus e a boa vontade divina, quem sou eu para julgá-la?"
         [sobre os homossexuais, contra sua marginalização pela sociedade, embora desaprove o ato gay]

         A questão é crucial para a Igreja Católica: mais árvores estão caindo e o bosque não cresce na mesma velocidade.
        

terça-feira, 23 de julho de 2013

CHAME O LADRÃO! CHAME O LADRÃO!

                          

      Alguma coisa está errada. 

      Restaurantes bons, sem frescura ou requinte, estão causando indigestão em São Paulo. Tida como a capital gastronômica nacional, houve tempo nessa cidade em que comer fora de casa era bom, farto e barato. Tão barato que os estrangeiros comentavam isso como algo positivo da maior e mais frenética metrópole do país. Quando era universitário cheguei a frequentar restaurantes e cantinas duas vezes por semana, pelo menos, com amigos ou namoradas. Um casal gastava R$ 30 para comer dois pratos individuais de massa, incluindo bebidas, chope ou refrigerante. Luxo era rachar a sobremesa. Era assim nas cantinas do Bexiga, no auge de sua glória, nos anos 70 e 80. Ah, o cafezinho era cortesia da casa!
      
       E mais: uma vez por mês dava para fazer turismo nos restaurantes mais sofisticados, aqueles com grife, em que o preço embute a saborosa decoração e talheres de prata. Era assim antes do real e da paridade com o dólar... A tal paridade acabou logo após a reeleição de FHC. Você se lembra?

       Pois é, faz pouco mais de uma década que o prazer de experimentar restaurantes passou a causar cólicas no bolso. Mas a coisa desandou de vez nos últimos meses. Bom, vejamos o caso de O Brazeiro, na Vila Mariana, conhecida casa que fez fama com seu galeto na brasa, bem temperado no limão, e que fica torradinho nas bordas e úmido por dentro. Agora ali um franguinho com polenta e uma porção de arroz para duas pessoas saem por R$ 90. Não, não cometi erro de digitação: noventa reais por extenso, por favor. Se ainda, por infelicidade, ocorrer um arrastão, algo em voga na cidade, você pode perder o relógio, o celular e também o que sobrou de dinheiro na carteira. Isso se não "pedirem" o seu carro "emprestado".

        Pizza, antes boa e barata, virou artigo de luxo na Paulicéia, realmente desvairada. Gastar R$ 40 reais numa redonda tamanho grande é de lei -- se for um pedido de entrega em casa. Se você preferir pegar o seu carro e ir a uma cantina, é uma loucura. Na 1900, uma pizza grande e alguma bebida fica em torno de R$ 120. Na tradicional Moraes, aquela da Brigadeiro, uma pizza grande com três sabores custa nada mais nada menos do que R$ 100, para duas pessoas, incluindo seis chopes, sem a gorjeta. Há o estacionamento, que fica por R$ 5, bem razoáveis diante do que se cobra por aí.
       
        Até o momento só falei de restaurantes pop... Outro dia parti para um teste de luxo: fui ao Bacalhoeiro, pra lá de famoso e, diga-se de passagem, com serviço impecável: em três pessoas gastamos quase R$ 300, sem couvert. Estava muito bom, mas é bacalhau a preço de ouro. E é pouco perto de outros restaurantes e bistros chiques paulistanos, destino de "gente diferenciada", jargão que surgiu para definir quem adora viver em seu gueto, longe do cheiro de povo.
    
        Talvez seja por isso que outro tipo de assaltante passou a frequentar as nossas mesas, como garçons às avessas. Tudo isso me fez lembrar do refrão de uma música de Chico Buarque: "Chame o ladrão! Chame o ladrão!" Ah, nem é preciso chamar, eles já estão chegando... e esse serviço não está incluído na conta.
 

domingo, 21 de julho de 2013

PAPEL DE BOBO E OUTROS PAPÉIS




       Antigamente o mundo era de papel. Era papel pra cá papel pra lá. Papel para ler notícias, papel para ler histórias, o casamento era só de papel passado, a multa era só de papel, havia muito mais burocracia para se tirar um papel, eram pedidos muitos papéis para "incentivar" as pessoas a usarem dinheiro (outro papel) pra acelerar a papelada. O dinheiro, aliás, é um papel tão valorizado que, como diz uma música, não só "ergue e destrói coisas belas", é capaz de transformar corações e mentes das pessoas: o que era bom vira ruim, o que era leve fica pesado, o que era alegre fica triste, o que era generoso vira avarento, o que era franco vira dissimulado, o que era claro vira sombrio, o que era verdadeiro vira falso. E por aí vai.
      
        Por que falar de papel? Por que o e-mail está matando (ou já matou?) o papel. O papel do bem, para ser bem claro. Quem ainda recebe hoje, pelo correio, cartas de amigos, parentes, amantes, namorados...? Lembro-me até hoje de um cartão-postal que recebi de uma paixão adolescente que estava passeando em Paris, sim aquela cidade dos sonhos, eu era estudante de filosofia e capital francesa ainda era nos anos 70 a cidade-luz, do conhecimento e da cultura. O nome dela? Agora não vem ao caso. Loira com leves sardas no rosto, por quem eu nutria um amor platônico na universidade, tamanha era minha timidez. O cartão-postal estampava de um lado a reprodução do cartaz do filme romântico. Do outro, aquele papel inesperado trazia uma boa nova. Ela pensara em mim, o que no vigor dos meus 20 anos atiçou e muito meus desejos mais primitivos. Ela até havia desenhado, à caneta, uma caricatura exacerbando meu farto cabelo "black power". Lembro-me também de ter recebido depois, pelos correios, outras duas mensagens fortes, por carta. Eram de outra garota, avançadinha, que fazia faculdade de jornalismo, elogiando os beijos que experimentamos embriagados em um bar. Ela me cobrava de modo, diria, no mínimo ardido, uma continuidade e falava de forma agressiva [em três folhas daquele papel fino de carta] de meus supostos (?) medos. Destilava sua raiva. Falando de minha covardia queria, na verdade, me encher de coragem.
        
        Mas por que afinal falar de papel? Porque hoje em papel só chega notícia ruim: contas a pagar, uma atrás da outra. Luz água condomínio telefone plano de saúde caro extrato bancário, assim mesmo sem vírgula. É verdade, chegam também outros papéis, de pizzaria, mais pizzaria, outra pizzaria, restaurante chinês, pizzaria, restaurante japonês, agora tudo com vírgula, pelo menos tenho a chance de jogar esses papéis fora.
     
         Outro dia porém, das contas a pagar, contrariando minhas expectativas, não chegou em papel a do seguro do carro. A realidade veio por e-mail. Papel pra quê? Veio pela rede, a corretora enviara cotações de várias empresas. O valor era estratosférico em todas, o mais baixo significava subir de 100% de um ano pra outro, para um carro com três anos de uso. Roubo fraude inflação nada explica sem vírgula isso. [E não há passeata contra a alta do seguro, porque carro agora é vilão no (in)sustentável mundo moderno.] Tive de aceitar e fazer papel de bobo, escutando da corretora, por telefone, explicações inexplicáveis, mentiras em cascata. A outra opção seria vender o carro.

       Pensei, não há mesmo como fugir, tenho que abrir a cada dia a caixa de correio, de lata. Lá onde só bate notícia ruim. Nenhum cartão-postal. Para alguns, ainda vem o jornal de papel, com escassas notícias boas em meio a um mar de notícias ruins. E o e-mail? É novo, rápido, limpo, mas já está obsoleto. E por ele não chegam sonhos como os de antigamente. Inesperados. Amorosos. Importantes. Agora o negócio é chat, bate-papo ao vivo, pancada, direto, sem (ou com) imaginação. Por e-mail aparecem comedidamente algumas mensagens de amigos e parentes. Mas já proliferam contas. Minha caixa-postal virtual fica cheia de propaganda, que preciso apagar toda hora, fazendo papel (olha o papel de novo) de palhaço.

       Ainda espero uma carta em papel ou um cartão-postal...

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quinta-feira, 18 de julho de 2013

MOTOSSERRA SANTA

      
Área já desmatada perto de igreja em Niterói - O Globo
          Madeeeeeira! Na surdina, a Igreja Católica tomou uma iniciativa muito simbólica – eu diria exemplar -- que mostra o tamanho de seu distanciamento em relação à vida ordinária dos homens e às prioridades do mundo moderno. Desde junho ligou a motosserra e sem autorização legal estava derrubando árvores centenárias do Parque Nacional da Serra da Tiririca, em Niterói (RJ), reserva de Mata Atlântica, tombada. Já se foram 334. Foi pega em flagrante por crime ambiental.   

          O primeiro motivo alegado: durante a Jornada Mundial da Juventude, no final deste mês, o papa Francisco deve rezar ali, na Paróquia de São Sebastião de Itaipu, uma missa campal para 800 romeiros. Não haveria espaço para o evento. A igreja fica colada ao parque. Depois que vazou a informação, 24 horas após o flagrante, a igreja alegou também risco de queda por “infestação de cupins”, dizendo que o vento já tinha derrubado 60 árvores e que 485 estariam comprometidas. Parte do desmate está no terreno da igreja, que tinha pressa – um pedido legal de corte demoraria meses para ser autorizado. Que beleza! Será que se o papa não viesse, a motosserra seria usada ou a natureza faria sozinha o "serviço"?

          A Secretaria do Meio Ambiente de Niterói, que se disse surpreendida, autuou a igreja no último dia 16. A diocese prometeu recuperar a área desmatada e a restinga da praia de Itaipu. Daqui a 100 anos, não estaremos vivos para conferir.
 
         Enquanto isso em São Paulo, moradores tentam evitar que 30 tipuanas sejam derrubadas para que “o tráfego possa fluir” na avenida onde fica o novo estádio de Palmeiras. E na Amazônia voltou a crescer o desmatamento: o fim disso tudo a gente sabe qual é: ali será um  grande deserto.


Fontes
Igreja derruba mais de 300 árvores para a visita do papa
Desmatamento volta a crescer na Amazônia
        


quarta-feira, 17 de julho de 2013

UM DIÁLOGO SOBRE A CULPA

 A jornalista Sandra Muraki postou  no Facebook




"Eu não fui fã do Cazuza, não acompanhei sua carreira. Gostava de algumas músicas dele, não pelas letras engajadas, mas pela melodia. Simples assim. Quando vejo notícias de gente sendo crucificada pela imprensa ou pela opinião pública sem que o suposto “problema” (acusação de qualquer tipo de crime ou conduta imprópria ou doença ou qualquer outra coisa do gênero) seja claro, me lembro dele. Não estou me referindo a nenhum caso específico na atualidade, só me deu na telha isso agora. No finalzinho de sua doença, lá pelos idos de 1988/89, eu trabalhava na Primeira Página do jornal e o caso da doença do Cazuza era tema de curiosidade e sensacionalismo. Ainda pouco se falava de Aids, a doença era tratada como um estigma e muitos a ela se referiam como “peste gay”, tudo isso fruto do desconhecimento, do medo e do preconceito. Várias vezes, Cazuza foi levado por sua família para temporadas de tratamento em Boston. Nessas ocasiões, o jornal acionava seu correspondente em Nova York para “caçar” Cazuza e tentar entrevistá-lo. Um fotógrafo ao estilo “paparazzo” perseguia o cantor pelas ruas. Cazuza, magrinho, debilitado, fugia, tentava se preservar. E nós, na Redação, fazíamos chamadas um tanto quanto sensacionalistas, mostrando essa triste situação, com fotografias em cineminha mostrando a fuga do cantor. Lembrando hoje, sinto muita tristeza de ter participado disso, do quanto fomos desrespeitosos com Cazuza, com sua enorme dor física e espiritual. E até hoje ainda vemos casos em que a imprensa passa por cima dos compromissos éticos, humanitários, e abraça o sensacionalismo que vende jornais. Por isso, “eu preciso dizer que te amo”, Cazuza."


Meu comentário

Nunca fui fã do Cazuza, mas gostava de algumas de suas músicas, que viraram hinos de uma época do fim e do pós-ditadura. Era o tempo da Nova República, e as mazelas de nosso país já apareciam mais na TV e nos jornais, a nova democracia expunha nossas fraquezas, nossa miséria, sem que tivéssemos a quem acusar. Os milicos já estavam só nos quartéis. Mas a trabalho pela Folha, depois de enviar uma reportagem, vi um show de Cazuza em Salvador, na Bahia, no Teatro Castro Alves. Ele já estava bem "baleado", interrompeu o show várias vezes, e acho que eu estava ali fazendo uma homenagem, por sua luta solitária e digna contra uma doença que naquela época matava, que era quase um palavrão impronunciável, um martírio que promovia o preconceito. Acho que, inconscientemente, fui dizer adeus para um sujeito que assumiu a doença em 1989, um ano antes de morrer. Curiosamente, depois de sua morte, a prefeita Erundina deu o nome do cantor a uma praça num morro da Vila Beatriz: E eu cobri a inauguração, que teve a presença da mãe de Cazuza... Passei outro dia lá, e a praça estava abandonada, só mato.

PS - Sandra, sei como é, tenho outros incômodos incuráveis também. Vira e mexe eles reaparecem nos pensamentos e tento encontrar uma justificativa para aliviar uma ação ou omissão da qual tenho vergonha...

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O FIM DA VIDA PRIVADA

 

Não é mole, não! Não basta dizer "good morning, Obama" toda vez que vc entrar na internet pela manhã. Afinal, "they can" [os americanos podem] nos espionar e ninguém põe isso a limpo. Agora temos outro invasor. Dá medo. Quando George Orwell escreveu "1984", o fez apontando seu olhar sobre o regime comunista, como controlador até do ar que as pessoas respiravam. O comunismo acabou de podre, asfixiado por ele mesmo. Pelo lema, o Estado finge que me paga e eu finjo que trabalho. Agora, que a história tem um "vencedor", vivemos sob a ameaça totalitária da iniciativa privada por meio do "admirável" mundo novo virtual e suas inúmeras câmeras, chips, cookies e outras formas de invadir a vida alheia. Sim, tudo pode virar público, qualquer um pode estar sendo vigiado sem que se saiba o grau exato da invasão. E lembrar que já houve tempo em que se discutia nas escolas do pensamento a importância da diferença entre público e privado? A descarga foi dada, foi tudo pelo ralo.

OS MÉDICOS E O POVO

 
13/07

Afinal, do que estamos falando??? Quem deve ir primeiro para os sertões brasileiros: os equipamentos ou os médicos. Abaixo, o trecho final do artigo de Janio de Freitas, na Folha, esclarece a questão.

"Por que não experimentar com mil ou dois mil médicos? Se a experiência com metade deles der certo, ou que seja um terço, um quarto, já se terá aprendido muito, mas, sobretudo, quanto alívio terá sido dado, quantas crianças terão deixado de sofrer, se não de morrer?

E, se a carência impeditiva está no interior, os grandes centros urbanos estão equipados para o atendimento à população, mínimo embora? Há três dias noticiava-se que o Hospital do Andaraí, pronto-socorro e referência em queimados no Rio, estava com as cirurgias suspensas por falta até do material mais simplório, como cateter. A desgraçada periferia de São Paulo inclui serviços médicos com o equipamento necessário? Essa discussão não é sobre médicos, hospitais, postos de saúde, equipamentos. É sobre doença, sofrimento, partos, mortes, crianças."

VEM PRO PARQUE

7/07

VEM PRO PARQUE, VEM!


Domingo azul, sem uma única nuvem no céu, temperatura agradável. Nesse cenário, participei do concerto da Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo (OESP), ao ar livre no palco reversível do Auditório do Ibirapuera, naquele belo teatro desenhado por Oscar Niemeyer. Fui acompanhado por mim mesmo. Não que eu não quisesse companhia. Embora queira sair de meu casulo, ainda ando meio reticente. Já melhorei bastante, em face aos últimos acontecimentos. E a música de Serguei Prokofiev, na versão OESP, sem dúvida a nossa melhor orquestra, encheu minha manhã de alegria e de serena reflexão, uma sensação de bem-estar (completude, a primeira palavra que me veio à cabeça, seria demais). Bastante gente no parque,.. mas não para o show. Não à toa o Ibirapuera foi eleito recentemente pelos usuários do TripAdvisor o melhor parque da América do Sul. A cidade de São Paulo precisa mesmo de mais Ibirapueras, Villa-Lobos etc. Congonhas, por exemplo, poderia virar um parque, sem demolir o belo prédio de embarque e desembarque. O Campo de Marte, outro. Onde colocar os aviões? Não sei, quando souber aviso. Que tal criar um novo movimento? O "Vem pro parque, vem!", inspirado no recente e quase "libertário" "Vem pra rua, vem!"
Bom domingo, bom feriadão...


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UM POUCO DE POESIA

05/07

FALANDO DE AMOR

Por vezes leio essa poesia que me faz lembrar de mulheres que me fizeram feliz. Tudo bem, pirei em público. Que medo. Ela se chama "Sua Luz Interminável"....

Sentir-la à distância como uma estrela tão próxima/
 que todas as fronteiras separam./
 Perceber sua luz interminável na quietude noturna/
 abrindo-me uma ferida de obsessão e de abismo/
 Escutar o silêncio que destilam as horas,/
 sentindo-o crescer como um latido escuro
 de destruição e morte./
 Calar-me e aceitar a sombra que tua ausência
 vai deixando nas coisas.
 
PS - O autor é Justo Jorge Padron, poeta das Canárias, que a escreveu em 1979, e consta de uma coletânea "Poesia Espanhola Contemporânea (1939-1980).

11/07 

(este é um dos 10 melhores poemas de Carlos Drummond de Andrade)

CONGRESSO INTERNACIONAL DO MEDO

Provisoriamente não cantaremos o amor,
que se refugiou mais abaixo dos subterrâneos.
Cantaremos o medo, que esteriliza os abraços,
não cantaremos o ódio, porque este não existe,
existe apenas o medo, nosso pai e nosso companheiro,
o medo grande dos sertões, dos mares, dos desertos,
o medo dos soldados, o medo das mães, o medo das igrejas,
cantaremos o medo dos ditadores, o medo dos democratas,
cantaremos o medo da morte e o medo de depois da morte.
Depois morreremos de medo
e sobre nossos túmulos nascerão flores amarelas e medrosas

VIVA A DEMOCRACIA

13/06

VIVA A LIBERDADE

     Veja como são as coisas. A garotada que foi às ruas me fez lembrar de um ato público contra o regime militar (1964-1985), marcado para o Largo São Francisco, em 1977. A polícia da ditadura e do cel. Erasmo Dias (que já foi desta para uma pior) ocupou o largo. Houve, então, dezenas de passeatas pipocando pelo centro todo de São Paulo, durante uma tarde inteira, apesar de nós estudantes sermos seguidos por policiais à paisana (cheguei a apontar para um deles, no outro lado da rua e ele ficou sem graça, tentando se esconder, como um rato que era). Nesse dia, uma foto ganhou o mundo, a de uma estudante sentada no chão, com o medo estampado no rosto, enquanto um PM com uma cinta na mão, pronta para açoitá-la. Mas escrevo todas essas linhas para dizer que, naquele dia, o que chamou minha atenção, e me encheu de orgulho juvenil, foi ouvir de office-boys e meninos de rua "vcs [nós estudantes] são foda, prometeram e vieram enfrentar a polícia. Um deles, animado, começou a querer quebrar lojas e toldos das fachadas. A gente falou pára! pára! senão vão chamar a gente de baderneiro, ou de vândalos... e eles pararam. A gente queria a democracia, e ela está aí, com todos os seus defeitos. São histórias de um período nefasto, de trevas, de medo, em que passeata era proibido. E eu não perdia uma passeata. Daria (ou dá) um livro... Foi o início do fim do silêncio. É o que as manifestações de agora me fizeram lembrar.


14/06

O PREÇO DA LIBERDADE

     A despeito do direito irrevogável à manifestação, essencial à democracia que defendi ontem, uma pequena reflexão mais objetiva sobre incidentes violentos precisa ser feita. Claro está que o protesto foi e é organizado por estudantes e jovens militantes de esquerda oriundos do PT antigo, que abrigava de social-democratas a radicais ortodoxos, que hoje caminham fora do petismo, e contra o petismo. Pela imagens fica claro que não são eles que sofrem com o aumento das passagens de ônibus em São Paulo. Afinal, como estudantes, eles pagam meia. A tarifa subiu de R$ 3 para R$ 3,20. Ou seja, para eles o custo (subsidiado) é de apenas R$ 1,60. Será que eles -- esses estudantes e radicais -- aceitariam cortar esse subsídio para garantir um preço menor para quem depende mesmo de ônibus e metrô? Há que se considerar que, antes do bilhete único, esse custo era bem maior. Hoje paga-se a condução por tempo de uso, podendo combinar por exemplo ônibus e metrô etc. O passageiro gasta agora R$ 3,20 para no mínimo duas conduções. Quem utiliza mesmo o transporte coletivo todos os dias, e sofre com suas deficiências, não está reclamando --- pelo menos por enquanto. Há que considerar ainda que existe o vale-transporte que também reduz o valor da tarifa cheia para o trabalhador. Ontem mesmo houve greve no superlotado sistema de trens metropolitanos e não houve quebra-quebra por parte do povão mesmo – sim, o povão, aquele que para a esquerda antiga seria massa de manobra, a ser conscientizada por uma "vanguarda". Ok, a democracia prevê o confronto. Mas nada justifica o vandalismo. Nada também justifica a violência policial, que me pareceu muito interessada em se vingar de jornalistas, fotógrafos, cinegrafistas, gente que estava tomando cerveja em boteco ou fugindo da confusão... Segunda-feira tem mais!

17/06

CONTRA TUDO
 
       Com o perdão dos companheiros, a passeata multifocal reuniu deus e o diabo na terra do sol, o que aparentemente pode revelar uma fragilidade da democracia brasileira. [opa, antes de atacar a primeira pedra, leia até o fim, porque sempre fui favorável à liberdade de manifestação e expressão, e continuo a ser] A divisão em três grupos na passeata em São Paulo e o leque de mazelas (do novo preço do ônibus e à corrupção) para a qual foi convocada me assustam. Confesso que me assusta pela falta de lideranças de peso e de interlocutores, e mostra o desencanto com os partidos, principalmente PT e PSDB, que dirigiram o país nos últimos 12 anos. Quem vai conseguir ser o catalisador dessas insatisfações? Ali estavam integrantes do Passe Livre, PSTU, PSOL, punks, anti-punks, petistas insatisfeitos, ex-petistas, tucanos, ex-tucanos, anarquistas, patriotas, oportunistas, anti-Copas e um montão de gente bem-intencionada. Havia todo tipo de palavra de ordem, algumas contraditórias, bem diferente da Campanha das Diretas Já e do impedimento de Collor. É o que tenho a dizer... espero que dê tudo certo! Amanhã, será outro dia?

20/6

AÇÃO DIRETA
 
     A coisa está ficando feia..Ação direta costuma dar merda. Essa de coisa de sem partido é ainda mais perigosa... Quem fala por quem? Qual é a reivindicação da vez? Não conheço democracia sem partidos... Democracia sem partido é ditadura. Cá entre nós, tem gente querendo ver o circo pegar fogo. E tem apresentador cretino, mais preocupado com a audiência falando muita bobagem na TV de forma irresponsável. Só falta defender a volta da ditadura militar. A democracia, com todos os seus defeitos, é o melhor regime que temos para o momento. Vivemos sim uma crise de representatividade. Se o regime fosse parlamentarista, era só trocar o primeiro-ministro e convocar eleições.

21/06

A mídia que era contra o MPL (Movimento do Passe Livre) e um dia virou a favor das manifestações. Agora, arrependida, depois de defender o "sem partido", deve voltar atrás e defender a ordem. Hoje, embora a conjuntura seja bem diferente, ruma-se para o caos. Em 1964, os milicos alegaram ameaça comunista e a corrupção como motivos para a intervenção golpista. Se a coisa sair do controle... Com o quebra-quebra que começa a surgir nas periferias (quase ninguém deu, mas na zona sul paulistna já saquearam a Casas Bahia e outras lojas) a coisa vai ficando preta. Logo logo parte da sociedade vai exigir o fim da “baderna”, e pedir ordem e progresso. Como desmobilizar agora gente sem lideranças e golpistas usando a internet para promover o caos. Há quem interessa isso? A democracia prevê o confronto, de ideias. Na França, em Paris, 1 milhão de pessoas foram às ruas contra a união gay e outro 1,2 milhão de pessoas foram a favor. Gostaria que no Brasil toda essa força fosse resolvida em manifestações contra ou a favor de medidas objetivas, como ocorreu com a tarifa de ônibus e com protestos pacíficos no Congresso, por exemplo, sobre temas também importantes. Na surdina, tem gente importante defendendo o caos, com objetivos políticos claros... 

25/06

DÁ PARA EXPLICAR?

Alguns dias antes da avalanche de protestos, os institutos Datafolha e Ibope apontavam governantes com avaliação elevada, embora as duas pesquisas também registrassem queda de oito pontos percentuais na aprovação do governo Dilma Rousseff. Pelo Datafolha, 57% avaliavam o governo Dilma como bom ou ótimo, contra 65% em março. Pelo Ibope, caiu de 63% para 55%. No Estado de SP, a aprovação de Geraldo Alckmin era de 52%. Novas pesquisas devem derrubar esses índices. Mas, curioso, as pesquisas não captaram o tamanho da insatisfação.

A FELICIDADE DE FELICIANO

10/04

 O obscurantista Feliciano está feliz da vida... virou o deputado mais falado e conhecido do Brasil, infelizmente. Nenhuma assessoria faria melhor. Ele já ficou mais do que aqueles 5 minutos de fama a que, democraticamente, todo mundo teria direito -- mas a maioria não usa ou não tem a oportunidade. Quando ele percebeu que tinha virado um símbolo, botou o pé na tábua a acelerou nas declarações. Já é assunto há quase dois meses. O pior é que não dá para ignorá-lo. E a cada dia surgem mais declarações estapafúrdias e preconceituosas deste senhor. Sob tanta luz, o tempo dele está se esgotando, mas Feliciano ri, está reeleito. Muita gente concorda com ele e fica quieta