O papa Francisco ganhou a simpatia popular antes mesmo de abrir a boca no Rio de Janeiro. A empatia começou já na chegada, usando no cortejo um carro simples, com vidros abertos, beijando crianças, acenando para a multidão em delírio, quebrando os protocolos de segurança -- que ficaram mais rígidos após o papa João Paulo II sofrer um atentado em maio em 1981 [JP sobreviveu a dois tiros de revólver de baixo calibre dados por um jovem turco de 23 anos], em plena Praça de São Pedro, no Vaticano.
Francisco surpreendeu ao defender abertamente a rebeldia dos jovens ("sejam revolucionários", pela ótica cristã), a necessidade de reforma na Igreja Católica, com uma proximidade maior com o povo (para estancar a perda de fiéis), e a simplicidade contra a ostentação. Tem mais: no voo de volta a Roma manifestou-se contra a marginalização dos homossexuais (embora desaprove o ato gay). E admitiu ainda que a Igreja, "como qualquer outra organização", comete erros [vide os escândalos financeiros e a pedofilia em seus quadros] e acertos, mas que ela deve dar o exemplo. "Faz mais barulho uma árvore que cai do que um bosque que cresce", disse.
Francisco tem literalmente toda a razão. Antes de sua chegada ao Brasil, não só uma árvore caiu: 334 árvores centenárias foram derrubadas, na surdina, em reserva tombada de Mata Atlântica, por integrantes da Paróquia de São Sebastião de Itaipu, em Niterói. O crime ambiental repercutiu. Ali estava prevista uma missa campal para 800 peregrinos. Claro [durma-se com um barulho desse, de madeira caindo], o evento com a presença do papa acabou não acontecendo. O caso em si terminou em pizza: multa de R$ 10 mil e a promessa de replantio.
A seguir, sete significativas declarações do papa Francisco que ficaram depois que ele se foi. São temas que, de uma forma ou de outra, tratam do dilema (de vida ou morte lenta) da Igreja Católica:
"Um jovem que não protesta não me agrada. Porque o jovem tem a ilusão da utopia, e a utopia não é sempre ruim. A utopia é respirar e olhar adiante. O jovem é mais espontâneo, não tem tanta experiência de vida, é verdade. Mas às vezes a experiência nos freia. E ele tem mais energia para defender suas ideias. O jovem é essencialmente um inconformista"
[sobre o alto índice de jovens desempregados na Europa e as manifestações de jovens no Brasil]
"A Igreja precisa de reformas, há coisas que serviram no passado e agora não servem mais. A Igreja precisa ser dinâmica"
[sobre mudanças na Igreja Católica, a partir deste ano, sem revelar quais e o teor delas. Sabe-se que o divórcio será um dos temas]
"Nosso povo exige pobreza dos padres. Não é um bom exemplo um padre ter um carro de último modelo, de marca"
[sobre o fato de andar em carros simples e o exemplo que os padres devem dar]
"Para mim é fundamental a proximidade da Igreja. Porque a Igreja é a mãe. Nem eu nem você conhecem uma mãe por correspondência. Uma Igreja ocupada por mil coisas, que se descuida da proximidade e só se preocupa com documentos, é como uma mãe que fala com seu filho por cartas''
[sobre a perda de fiéis da Igreja Católica para outras crenças]
"Antes de viajar, fui ver o papamóvel e ele estava com vidros. Se você quer fazer amigos, se comunicar, vai visitá-los em uma caixa de vidro? Não dá pra visitar um povo com esse grande coração em uma caixa de vidro"
. [sobre sua atitude de permitir a proximidade com os fiéis em sua visita ao Brasil]
"Faz mais barulho uma árvore que cai do que um bosque que cresce"
[sobre escândalos na Igreja, que, diz ele, também comete erros; e os erros da Igreja aparecem mais]
"Se uma pessoa é gay e procura Deus e a boa vontade divina, quem sou eu para julgá-la?"
[sobre os homossexuais, contra sua marginalização pela sociedade, embora desaprove o ato gay]
A questão é crucial para a Igreja Católica: mais árvores estão caindo e o bosque não cresce na mesma velocidade.