Uma agulha no palheiro. Informação selecionada e às vezes comentada, histórias do dia a dia dos mortais, crônicas e tudo aquilo que mexe com o humor de um jornalista inconformado
domingo, 28 de agosto de 2016
AMOR, ESTRANHO AMOR
Não se sabe quando, mas algum dia depois de uma satisfação ligeira vem o gosto azedo e corrosivo do arrependimento, da sensação de incompletude que a coisa passageira parece dar ao desavisado. Quantas mentiras foram ditas, quantas falsos juramentos foram feitos. Quantas palavras ao vento. Calma, não se aborreça. Não se interesse por isso. Afinal. a quem quis enganar? Só enganou a si mesma. Apressada, fez a troca dominada pelo impulso, e a noitada não deu em nada. Não foi nada daquilo, bateu na porta errada. E, se não foi desta vez, quando será o novo descarte? De repente, você está diante de perguntas mais pesadas sobre o sentido daquilo tudo. E o vazio já terá voltado sorrateiramente para dentro de casa, outra vez. Qual é afinal a direção certa, sem escalas, da felicidade e do fim da monotonia? Quem sabe o caminho das pedras? Ou só há pedras no caminho? E atiramos pedras para todos os lados e -- só para tirá-las do nosso sendeiro -- é aquele selvagem salve-se quem puder?
Aquele rapaz já havia sido preterido. Quem nunca foi? Ele lembra agora o que ouvira de uma ex-namorada adolescente que reencontrara numa padaria já mulher: "Não sabia que havia te magoado tanto!", disparou ela. Foram três longos anos sem receber dele um pio, um sinalzinho de vida. Ela, então, pediu desculpas, naquele reencontro por acaso com aquele homem [que a perdoara, mas para sobreviver precisara sumir para estancar o sofrimento]. Fora uma decisão dele, difícil de seguir à risca. Aos olhos dela, naquele momento, então, ele lhe parecia ainda mais bonito do que no passado, diferente. Como não notei isso antes?, pensou ela: ali percebera aquilo que até havia se dado conta antes, mas fingira não entender, repetindo à náusea a lenga-lenga de sempre "eram momentos diferentes". [Que gosto temos pelo auto-engano, não é?] Que ele, sim, a amara como nenhum outro, que desperdiçara uma chance. Por que é sempre assim? A gente só se dá conta depois? [Mas aquele homem ainda via beleza naquela mulher, claro que ela não era mais a mesma, mas ainda sentia atração por sua magreza sinuosa, seu olhar esverdeado e aquela boca... Claro eram tantas e boas lembranças, até mesmo do dia em deixaram uma festa e meio embriagados foram expulsos de uma delegacia, "saiam daqui!", onde pediam "queremos nos casar, o delegado está?"]
De lá para cá, quantas promessas não foram cumpridas. Muitas, poucas, grandes, pequenas? Tanto faz, estava feito. Novos momentos sublimes podiam vir? Sim, e vieram, juntos até o dia em que um câncer fulminante a matou em menos de três meses. Ele chorou muito. ela havia sido o seu grande amor da juventude. A segunda chance fora boa, mas curta. A vida é tão simples. Ele queria mais... Morreu do coração, dormindo, dois meses depois dela. Deixaram filhos, mas de outros casamentos.
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