segunda-feira, 9 de novembro de 2015

SEUL DEMOLIU MINHOCÃO E "RESSUSCITOU" RIO

Vista de córrego "ressuscitado" em Seul


           Dez anos depois de ver derrubado um Minhocão e de ter acabado com a avenida que "soterrava" o córrego Cheonggyecheon em Seul, por onde passavam diariamente 120 mil veículos, parte do centro da capital da Coréia do Sul mudou da água para o vinho. O lugar virou atração turística, área de lazer e fez diminuir a temperatura nos bairros centrais. E mais: o córrego foi despoluído. E o medo da piora do tráfego? Também não se concretizou. O que esperamos para fazer isso em São Paulo?

            A tese é a seguinte: quem disse que o tráfego só aumenta? Ele só aumenta se você aumenta o número de avenidas. A população, se incentivada, procura novos meios de transporte. A prefeitura dando novas opções induz mudanças [Quem disse que as trágicas marginais não tinham solução. O trânsito melhorou a 50 km/h e caiu o número de acidentes. Só falta "combinar" com os motoqueiros]. Nos livros de história, o Cheonggyecheon é citado no final do século 14 como um córrego pequeno e intermitente, que corria de leste a oeste pelo centro da capital como um afluente do Han, ao sul. O rio Han, largo, separa a antiga Seul dos "portões" da Seul moderna na ilha de Yeoido, a "Manhattan sul-coreana", onde foram construídos prédios novos, praticamente todos os ginásios, arenas e estádios para os Jogos Olimpícos de 1988. Quadras de tênis e futebol fazem da orla do Han "uma imensa praia",  de onde se pode ver gente velejando ou praticando windsurfe. No antigo e imenso banco de areia, desde antes de 1988, estão modernos edifícios habitacionais com pisos térmicos para os meses de inverno, de escritórios de negócios e a Assembleia Nacional, além da antiga vila olímpica e grandes espaços abertos. Na verdade, a "Manhattan sul-coreana" é menos adensada e vertical que a original americana. Seul tem 9 milhões de habitantes.

           Insatisfeitos com o córrego Cheonggyecheon e suas inundações, governantes iniciaram projetos de retificação e canalização há pelo menos dois séculos, seguindo interesses de segurança e bem-estar públicos. Muitas pontes foram construídas. Com a ocupação japonesa (1910-1945) da península coreana, o riacho recebeu o nome atual, que significa "água limpa" em japonês. A península coreana foi invadida várias vezes por chineses e japoneses e não é uma história da qual os coreanos gostam de lembrar. "História suja", "vergonha" dizem até hoje as mulheres sul-coreanas. Como em outras invasões, o invasor implacável [os japoneses que anexaram o território]
humilha e estupra as mulheres dos vencidos.

          Segundo especialistas, com a rendição japonesa na Segunda Grande Guerra, o nascimento da República em 1948 e o fim, em 1950, da guerra que matou mais de um milhão de sul-coreanos e permitiu a cisão do território em dois países no paralelo 38, o Cheonggyecheon foi "sepultado" com a construção de uma avenida sobre o rio. Desta vez, o motivo foi o transporte. Estendendo-se por 6 km pelo centro, as obras começaram em 1958. E na era do automóvel, entre 1967 e 1976, foi feita a Via Expressa Elevada, por onde chegaram a passar 120 mil veículos, incluindo ônibus, por dia [no Minhocão paulistano circulam diariamente estimados 80 mil carros]. A partir de 2001, depois de muita polêmica ficou claro para a população e urbanístas coreanos que a via expressa era insustentável por vários motivos. 
            
      Então, em 2005, após 27 meses de construção, ao custo de US$ 380 milhões, a pista elevada foi demolida e o córrego "ressuscitado" com o fim das faixas de trânsito que o encobriam -- foram feitos estudos sobre as cheias em 200 anos para evitar novas inundações após a obra de revitalização, além de investimentos paisagísticos, como a feitura de caminhos a beira-rio para pedestres  e ciclistas [veja foto acima]. O medo de um tráfego intolerável nunca se concretizou, porque o governo providenciou mais transporte público, metrô e ônibus especial no centro, além de faixas reversíveis nas ruas existentes e outras opções de rotas. A maioria das pessoas que visita hoje o novo espaço chega de metrô. O lado negativo dessa história, segundo alguns urbanistas, é a dificuldade de criar novos negócios em trechos do córrego devido à valorização do metro quadrado da região de Seul. Ficou muito caro se instalar ali... incrível, não é? O que estamos esperando?

Luminárias humanas festejam o córrego Cheonggyecheon (*)


[* foto de Bruno Mortara]



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