sexta-feira, 30 de agosto de 2013

ATÉ SEMPRE, LORRAINE



                                                           
Quando o papel venceu a internet. Após 75 anos de casamento, Fred Stobaugh, se viu sozinho. Seu único amor, Lorraine, morreu aos 91 anos em Illinois, nos Estados Unidos. A dor pela perda levou Stobaugh, com 96 anos, a participar de um concurso musical promovido pelo estúdio Green Shoes. Ele jamais poderia imaginar que a sua história de amor pudesse virar música e entrar na lista das 10 mais vendidas da iTunes Store americana, segundo a revista RollingStone.

     Stobaugh escreveu uma letra em homenagem à esposa e a enviou pelos correios para o estúdio. Na carta, ele também falou da saudade que sentia e dos anos vividos juntos. O estúdio recebeu dezenas de e-mails com links das músicas dos concorrentes. Só a de Stobaugh veio num envelope de carta, por isso chamou a atenção. Na letra da canção, escrita a mão um mês após a morte de sua companheira de vida, ele diz: "Doce Lorraine, gostaria que pudéssemos viver todos os bons momentos de novo/ Doce Lorraine, a vida só acontece uma vez, nunca de novo". Pego de surpresa, o pessoal do estúdio resolveu então investir, com músicos e cantor profissionais, e criar uma melodia para a letra de Fred Stobaugh. O vídeo mostra a primeira vez em que Stobaugh ouviu a versão final, que ganhou o nome de “Oh, Sweet Lorraine”. "Espero que você goste", disse um dos envolvidos na gravação. Após ouvir a canção, Stobaugh, muito emocionado, disse: "Maravilhoso, maravilhoso, maravilhoso, parece um sonho, mas é real, é real". A história repercutiu na comunidade local e virou tema nas escolas.

       Escute a música "Oh, Sweet Lorraine"

       A repercussão na comunidade



quarta-feira, 28 de agosto de 2013

A CHEGADA DOS HOMENS DE BRANCO



Mais que deplorável, uma vergonha, a reação dos médicos brasileiros à chegada de seus pares cubanos para atuar nos rincões miseráveis do Brasil, onde muita gente só sabe o que é um médico pela televisão. Com sorte, atualmente, há quem seja atendido por um médico uma vez por ano. Essa é a realidade drástica fora das grandes cidades do país e nos lugares mais distantes da costa. As vaias e os gritos de "escravos" no aeroporto são um triste retrato do corporativismo sem sentido -- que coloca sob holofotes apenas uma das várias fraturas expostas da saúde brasileira: a má distribuição de médicos pelo território nacional.

      Para quem mora numa dessas regiões desassistidas, pouco importa a língua que os homens de branco falem. A presença deles pode significar a diferença entre viver ou morrer. Pode significar o combate a um leque de doenças, algumas muito perigosas, em que a prevenção [ou um tratamento cedo] evitaria óbitos, principalmente de crianças. O espanhol não é, digamos assim, um idioma de difícil compreensão, quando falado pausadamente. Em duas viagens a Alcântara, no Maranhão, em férias escolares [portanto faz tempo], conheci o filho de um pescador de camarões de quem acabei ficando chapa. Ele me contou certa vez que já recebera outro hóspede em sua casa e que ele falava um "português meio enrolado". Na conversa, descobri que era um uruguaio.

     Ao ouvir os gritos de "escravos" no aeroporto, um cubano entendeu o que falavam, e reagiu: "Não sei porque diziam isso. Não vamos tirar seus postos de trabalho. Seremos escravos da saúde, dos pacientes doentes". Nas redes sociais, leia-se Facebook, o tema virou motivo de agressividade entre internautas. Uma jornalista gaúcha, que depois se arrependeu e se retratou, chegou a dizer que as recém-chegadas "médicas cubanas têm cara de empregada doméstica". Estava falando obviamente de médicas negras, preconceito e racismo em estado bruto. Pois é, as aparências enganam. Na ilha de Fidel -- com todos os erros e fracassos econômicos -- o analfabetismo foi praticamente zerado. O problema lá é de outra ordem: um barman de hotel em Varadero me revelou que era formado em engenharia naval, mas preferia servir drinques e petiscos porque ganhava mais. Não vale a pena revelar o quanto mais. É irrisório.

     Há 20 anos estive em Cuba, e ouvi o dilema de uma jovem em Havana. Perguntei porque falava mal de Fidel, e ela me respondeu: "Não estou falando mal, sem ele eu seria uma empregada doméstica. Não teria feito faculdade. Mas quero comprar sapatos". À época, salvo engano, o planejamento estatal só previa a compra de um par, por ano, por pessoa. Nossas médicas bem-sucedidas vestem Prada e podem comprar quantos sapatos quiserem. Não querem comer poeira, depois de anos de formação. É um direito legítimo. Mas não tem sentido tentar impedir o direito à vida dos esquecidos, aqueles que só são lembrados em ano eleitoral.

     O argumento de que não há infraestrutura nesses locais é de conhecimento geral. É assim há décadas. A corrupção, o desvio de dinheiro e o fato de a maioria dos municípios brasileiros não ser auto-sustentável [são dependentes de verbas federais] explicam grande parte dessa tragédia. Para quem nada tem, ser atendido por um médico é a salvação. É uma chance, ainda que precária. Nos idos dos anos 90, fui a trabalho para uma cidade no interior de Rondônia. Ali só havia um médico. Não havia equipamentos básicos, e ambulância só uma vez por semana, ou em caso de urgência, vinda de outra cidade próxima. A fila era grande, com gente de tudo o que é lugar nas redondezas. Ninguém se atreveu a falar mal daquele homem: "Ele é tudo o que temos, e atende a todos", disse uma mulher com o filho no colo.

     É preciso dizer mais?

     

terça-feira, 27 de agosto de 2013

CASAL FAZ SUA PRÓPRIA PELADA


Casal faz 1 a 1 no círculo central, após jogo sonolento

       Todo mundo tem seus desejos primitivos secretos, guardados a sete chaves pelos casais e posto em prática com a evolução da vida a dois. Há quem aprecie sexo com o barulho das ondas, sobre uma canga na praia em noite de lua cheia [sem a metáfora religiosa e pecadora do Conde Drácula]. Ou debaixo de uma camionete parada na garagem do pai da garota, ou na escadaria de incêndio de um prédio, ou em elevador parado pela falta súbita de energia. Nessas ocasiões, o medo de ser flagrado aumenta a emoção, imagino. E a criatividade supera limites nessa hora.

      Pois bem, um casal foi flagrado fazendo sexo quase no meio do campo do Brondby Stadium, em Copenhague, no último domingo (dia 25 de agosto). Os dois jovens assistiram a partida entre Brondly e Randers, pelo "esfuziante" campeonato dinamarquês. Depois, escondidos, esperaram o estádio ficar totalmente vazio, invadiram o gramado, foram até o centro do campo e se engalfinharam. Sem aplausos ou vaias, o coito foi interrompido por um segurança, que deu cartão vermelho para a dupla, obrigando-a a se retirar do local sem o grito de gol.
  
     O jogo propriamente dito foi chocho: Brondby e Randers ficaram num sonolento 0 a 0. Pelo jeito, o casal dinamarquês queria um jogo mais quente. Trataram então de realizar sua própria pelada, partiram pro 1 a 1. O episódio foi fotografado e a imagem, postada no twitter por Mikkel Davidsen, assessor de imprensa do Brondby. Somos todos "feticheiros"?


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segunda-feira, 26 de agosto de 2013

FELIZ ANIVERSÁRIO, TODOS OS DIAS


Reza a cartilha dos bons costumes que deve-se enviar votos de saúde, felicidade e sucesso nas datas de nascimento de familiares, parentes e amigos. É mais que uma gentileza, é uma lembrança forte, uma retomada [em muitos casos] ou uma reafirmação da amizade e amor para quem está [ou esteve] por perto, no sentido mais amplo da palavra. Com o Facebook, porém, esse gesto ganhou outra dimensão. Porque a máquina nunca esquece e, como um despertador, dá o alerta com antecedência.

       Por isso, não é de hoje que penso o quanto me é "incômoda" [entre aspas] a lista de aniversariantes do dia que o Facebook fornece. Não é de hoje a vontade de escrever sobre esse dilema pessoal diário. É um assunto delicado, envolve amizades reais e virtuais, e tudo o que eu disser pode ser mal interpretado etc e tal. Todos os dias olho para o canto direito da tela com uma certa aflição, porque ali, me esperando, está o clique dos festejados. Tem até a imagem de um bolinho aceso. Quem serão os homenageados da vez? O que vou escrever? No ano passado, tentei ser criativo, em uma linha! O que vou dizer hoje? Será que a lista aumentou muito?

       Fiz as contas e constatei: não há dia livre. O Facebook registra que tenho 729 conexões. Ou seja, 729 aniversariantes. Devo então parabenizar duas pessoas por dia, em média. Haja criatividade para dizer, com outras palavras, "estou te olhando", "torço por você", "me lembro de você" ou "gosto de você". Fico imaginando, então, como é para quem tem 5 mil "amigos"? Esse indivíduo tem que mandar sua consideração para 13 pessoas por dia, em média. Trata-se de uma missão impossível. Nesse caso nem apelando para algo mais impessoal, protocolar, o carimbo da resposta padrão: "Parabéns, tudo de bom!", usando de um velho e conhecido expediente, o "cut and paste" [copia e cola] para todos. Não vejo mal nisso, afinal a saudação está sendo dada. Há uma deferência, ainda que a nossa pressa insana mecanize até nossas melhores relações.

      Acontece que há amigos e amigos. Os próximos e os longínquos. Os antigos e os novos. Os afinados e os desafinados. Os presentes e os ausentes. Portanto, para alguns é preciso mais zelo, uma saudação personalizada, mesmo que em uma frase apenas. Outro dia, recebi uma mensagem por e-mail logo ao "abrir os trabalhos" em casa. Era um lembrete ou uma ameaça? [fiquei na dúvida] "Hoje você tem 5 aniversariantes", dizia a mensagem. Só faltou falar: "Vai encarar?" Me questionei: quem mandou ter tantos amigos, colegas de profissão e conhecidos de todos os tempos e gêneros? Claro, enviei minhas cinco mensagens de "estamos juntos nessa".

     Por outro lado, para o aniversariante, o único jeito de responder à avalanche de mensagens é esperar o dia seguinte e fazer um agradecimento geral, amplo e irrestrito. [o recado acaba até chamando a atenção de retardatários] Seja como for, esse ritual moderno, essa ilusão facebookiana, nos faz acreditar que "não estamos sozinhos" nesse mundo. Ele infla a autoestima do felizardo -- e isso é tudo o que o felizardo quer e precisa. Ser o bem amado [pelo menos] por um dia.

             



    

sexta-feira, 23 de agosto de 2013

DILMA, SEM DESTINO


                                                      [versão atualizada]

     Ao melhor estilo "easy rider", sem lenço sem documento. Foi assim. “Coloquei o capacete e saí andando de moto pelas ruas de Brasília”. É o que a presidente Dilma Rousseff revelou ao ministro de Minas e Energia, Edison Lobão (PMDB-MA). Ela achou até que tinha driblado a segurança pessoal, para "sentir melhor os ares de Brasília", segundo a "Folha". O general Marcos Antônio Amaro, que comanda a segurança presidencial, porém, declarou que o giro de moto da presidente foi vigiado, mas à distância para não estragar a "aventura". “Fiquei sabendo, sim, e mandei acompanhar a senhora”, disse o militar. "A vida é cheia de riscos. Tudo que se faz na vida importa riscos", respondeu, brincando, a presidente.

     A escapada ocorreu no último dia 4, um domingo, durante a cerimônia da troca da bandeira na praça dos Três Poderes. Como não tem habilitação e não sabe dirigir motocicleta, Dilma foi na garupa. Na garupa de quem? Nada mais nada menos do que o ex-ministro da Previdência Carlos Gabas, que é atualmente secretário-executivo da mesma pasta. Fanático por motocicleta, o ex-ministro tem como hábito ir de Harley Davidson a reuniões no Palácio da Alvorada, residência oficial da presidente. Ela já havia dito algumas vezes a Gabas que um dia iria "dar umas voltinhas" pela cidade na garupa dele. Todos achavam, porém, que era só uma brincadeira. Nem imaginavam que o desejo de sentir o gostinho da liberdade fosse dar no que deu.

LEIA TAMBÉM
DILMA, SEM DESTINO 2 - (PEDALADAS)

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quarta-feira, 21 de agosto de 2013

PRIMAVERA ÁRABE ACABA EM MASSACRES

   

[versão atualizada]

Primeiro foi no Egito: 650 mortos. Agora a matança aconteceu na Síria: 1.300!? Entre os mortos há dezenas de mulheres e crianças (foto). Existe ainda a suspeita do uso de armas químicas contra os rebeldes e a população civil. Fotografias mostram centenas de corpos enfileirados, como no Cairo. Democracia? Nem pensar. Após eleição, a tentativa no Egito durou só um ano -- até o recente golpe militar. Na Síria, nem isso. A guerra civil já dura dois anos. Paz? Onde? A chamada "primavera árabe",  que derrubou alguns déspotas no meio do planeta, já acabou sem ter quase existido. [A cada dia fico mais convencido de que a humanidade é inviável.]

       George Sabra, um dos líderes da oposição síria, declarou que as mortes aconteceram na periferia de Damasco. Fontes citadas pela agência de notícias Reuters dizem que foram lançados foguetes com agente químico em Ain Tarma, Zamalka e Jobar, na região de Ghouta. Suspeita-se que seja gás sarin, neurotóxico. “Muitas das vítimas são mulheres e crianças. Chegam com as pupilas dilatadas, membros frios e espuma nas bocas”, disse uma enfermeira. A Síria não aderiu à convenção que, em 1997, baniu as armas químicas.

     "O que nos mata e mata nossas crianças não é apenas o regime. A indecisão americana nos mata. O silêncio de nossos amigos nos mata. O abandono da comunidade internacional nos mata, a indiferença dos árabes e muçulmanos, a hipocrisia do mundo que se acredita livre nos mata", declarou Sabra, em coletiva de imprensa em Istambul (Turquia). Depois desse apelo, ele disse também que não acredita mais em solução pacífica para o conflito.
   
      O governo nega o uso de armas químicas e diz que a oposição, por perder nas batalhas, quer desesperadamente obter apoio internacional. O presidente da Síria, Bashar Al-Assad, que está há 13 anos no poder, disse no último domingo (18) que "enfrentaria o terrorismo e o varreria do mapa".   


    PS - Os americanos já usaram como pretexto uma suposta produção de energia nuclear com fins bélicos para invadir outro país no Oriente Médio: o Iraque. Depois a realidade desmentiu a  acusação (mas as tropas já estavam em Bagdá, e Saddam Hussein, morto). Toda cautela é pouca. Na guerra, em geral, a primeira vítima é a verdade: é a batalha da contra-informação. Só o tempo dirá quem tem razão. De qualquer forma, com ou sem arma química, houve um massacre na Síria.


 
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segunda-feira, 19 de agosto de 2013

LATA DE SARDINHA VALE R$ 15 MIL


O relógio marcava 18h, do dia 2 de fevereiro de 2012, na estação Pinheiros da linha 9-esmeralda (Osasco-Grajaú). Um advogado, que ia para a Granja Julieta, bairro nobre da zona sul paulistana, pega um trem da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) lotado. Até aí, nada de extraordinário, é horário de pico. Ele não conseguiu lugar sentado, mas "a lotação ainda estava normal". Foi na estação seguinte que a coisa mudou de figura: o trem superlotou. E a cada nova estação havia tumulto nas portas dos vagões.

      Para ajudar o fluxo de entrada dos passageiros, funcionários da CPTM passaram a usar a "técnica do rodo" [aspas minhas]. Empurram todo mundo pro ralo? Não, perdão, pra dentro do trem. "Eles empurravam as pessoas, buscavam colocar mais gente", contou o advogado à Folha. [o rodo é um método utilizado há algum tempo no superlotado metrô de Tóquio, para fechar as portas dos vagões].

    Os trens paulistanos ficam tão cheios, com gente prensada como numa lata de sardinha, que é difícil até de achar um lugar para colocar os pés no chão, durante viagem em horário de pico. Para sair do sufoco, o advogado optou por desembarcar na estação Morumbi, uma antes de seu destino final, e foi a pé para casa. Antes, porém, aproveitou, tirou fotos e fez vídeos. Com provas à mão, entrou com ação por danos morais contra a CPTM, qualificando o serviço como transporte "sub-humano e degradante".

      Em julho do ano passado, o advogado perdeu a causa, em primeira instância. Mas recorreu e, no último dia 13 de agosto, a Justiça condenou, de forma unânime, a CPTM a pagar R$ 15 mil de indenização. A companhia ainda pode recorrer.
 
   Moral da história: faça como ele, faça valer os direitos de cidadão.  


 

 

domingo, 18 de agosto de 2013

SEJA REALISTA, EXIJA O IMPOSSÍVEL


Outro dia fiquei pensando na felicidade que as palavras e as fotos de uma amiga e seu recém-marido irradiavam pela internet. É uma luz forte mesmo quando alguém se encanta com o outro. Ela está vivendo esse momento mágico que é gostar muito de alguém -- é uma espécie de mundo da fantasia onde não há erros nem defeitos insustentáveis. Por isso, na sabedoria popular, "o amor é cego". Você, eu e outros mais já sentimos essa euforia, tudo parece estar no seu lugar, tudo que podia dar errado dá certo, é como se fosse uma "conspiração das forças do bem" na batalha do quase improvável (?) encontro entre duas pessoas. Acho que é ele. Acho que é ela.

        É definitivo!? A gente faz de conta que é. Intencionalmente, bloqueamos [temporariamente?] a tecla "apagar", que um dia você [ele ou ela] possa vir a fazer uso por motivo torpe ou não, em local incerto e não sabido. A força criativa desse momento só se compara à "noite eterna" que baixa quando o desenlace ocorre para [quem sabe? com sorte lotérica] um novo outro tome esse lugar. Nesse episódio, alguém sempre leva mais tempo, às vezes quase o resto de sua vida, para sentir o calor do sol outra vez. É difícil mesmo "matar" alguém que já morou dentro de você.

        O amor a dois está virando "esporte radical", o queremos com muita emoção. Parece não haver mais espaço ao comum, ao calmo, ao ordinário ou morno no apressado e fervilhante mundo de hoje. Queremos sempre o "extraordinário" [como um jornalista sedento que quer a notícia de impacto todos os dias.] É assim que um outro "definitivo" surge, e a graça de viver se retoma, até que a "normalidade" a sufoque. Li em algum lugar que [se entendi bem] em quatro anos [achei meio curto o tempo, mas foi o que li] a paixão pode se tornar indiferença, sadomasoquismo ou amizade (amor companheiro), que é quando se pensa em ficar velho juntos. Se não estou enganado, o artigo dizia também que quando não há separação e as alianças não significam algemas, a amizade floresce em troca do fim do desejo, matando aquele algo mais "extraordinário". Aí, sexo animal? Esquece.       

       É domingo, faz muito frio lá fora, e eu já dei boa noite e bom dia para o meu cobertor. Tragando um vinho tinto me sinto melhor: acho que a euforia do encontro, quando bate, é tão certeira quanto imprevisível. Ela pode surgir num ponto de ônibus, em saguão de aeroporto, num bate-papo pela internet, na fila do banco, na sala de espera do dentista, num inferninho noturno, nos lugares mais estapafúrdios. Estamos sempre olhando para os lados e, como a bruxa da Branca de Neve, por vezes perguntamos silenciosamente: espelho, espelho meu, espelho imundo, espelho imundo, existe alguém que possa me fazer mais feliz neste mundo?

       Essa busca frenética pela felicidade -- no trabalho, em casa, na cama -- coloca o amor ordinário, aquele que é uma gangorra de morros, com pequenos trechos de planície, na alça de mira ou em desuso. Seja como for, a gente só quer ser "feliz para sempre", todos os dias. Sejamos realistas, exijamos o impossível!


sábado, 17 de agosto de 2013

O PERFUME E O CHEIRO DOS MORTOS

      

Com perfumes fortes, familiares tentam disfarçar o cheiro dos parentes mortos no Cairo. O massacre de pelo menos 638 egípcios repercute no mundo. Os cadáveres, lado a lado, que aparecem em fotos e vídeos, estão descobertos ou cobertos por panos encharcados de sangue. Esse cenário macabro me fez lembrar de outro massacre, próximo a nós, ocorrido também por uma ordem do Estado, na Casa de Detenção de São Paulo, ou Carandiru. Em 2 de outubro de 1992, a Tropa de Choque invadiu o pavilhão 9, rebelado, e matou 111 detentos. Tudo começou por volta das 14h com uma briga entre dois presos. O motim acabou, mas o placar trágico só foi anunciado oficialmente no dia seguinte (sábado, dia 3), por decisão do então governador Fleury, e após o fechamento das urnas das eleições municipais, às 17h. Havia receio de que a matança influenciasse nos votos.

      O odor da morte a gente nunca esquece. Fica impregnado nas narinas, são precisos dias e dias, banhos e banhos para não senti-lo mais. Até hoje me lembro, ainda que vagamente, do cheiro de sangue nas celas e corredores do Carandiru [é meio parecido como parar de fumar, mesmo após alguns meses o vício se manifesta, vindo à boca um leve gosto de cinzeiro].

      Visitei, junto com uma comissão de direitos humanos, o pavilhão 9 um dia depois do massacre, com o presídio "limpo", com esguicho. Os corredores escuros e o piso molhado, cheio de poças meio avermelhadas, ainda estão vivos na minha memória. Além do forte cheiro de morte, havia marcas do embate entre PMs e presidiários. Em várias celas, vi marcas lineares de tiros na parede da janela, como se alguém tivesse aberto a porta do cubículo e dado uma rajada de metralhadora, na altura do peito. Aqui morreram 5, aqui morreram 8. Havia também sinais de fogo, colchões tinham sido incendiados pelos presos, para inibir a tropa militar. Enfim, cela por cela, evidências do abuso de poder. Saí dali com duas impressões. A primeira: não há perfume que faça sumir o odor "agridoce" da morte -- ligeiramente parecido com o que você sente num açougue. Depois: se o Estado democrático pode matar presos cumprindo pena sob sua custódia, eu posso comprar uma arma e me defender. Seria a guerra civil.
     
[Em tempo: o Carandiru foi parcialmente demolido em 2002. Virou parque]

A seguir, um resumo do inferno egípcio

      Quem não se lembra das grandes manifestações na Praça da Libertação (Tahrir), no Cairo, de janeiro a fevereiro de 2011, a chamada "primavera egípcia". Milhares de pessoas pediam a queda de Hosni Mubarak, que comandava o país havia 33 anos. Houve 850 mortes, mas a pressão das massas derrubou o ditador. Naquela multidão havia unidade de objetivo, mas ela escondia uma fenda profunda na sociedade egípcia. De um lado, jovens em busca da modernização do Egito (de certo modo sua ocidentalização) e de outro os islâmicos, que acabaram ganhando a primeira eleição democrática pós-Mubarak. No fim daquele ano, foi eleito Mohammed Mursi (da Irmandade Muçulmana).

      A paz durou 12 meses. Com o fraco desempenho da economia e medidas próprias de governos teocráticos, a decepção com o governo Mursi chegou cedo para a oposição secular, que levou as massas de volta à Praça da Libertação. Mursi acabou deposto pelos militares. Daquela primavera, não há mais nenhum sinal. O que se vê é um banho de sangue: é uma guerra civil.

quarta-feira, 14 de agosto de 2013

MÃOS SUJAS PARA TODOS


A grande mídia demorou, mas entrou na cobertura da corrupção envolvendo todas as gestões tucanas em São Paulo. Um cartel de multinacionais -- como a Siemens e a Alstom -- admitiu ter feito acertos com políticos e servidores durante os 16 anos do PSDB no poder, nas licitações de metrô e trens metropolitanos. As reportagens, porém, ainda são burocráticas, não vão atrás do dinheiro.

         O verbo "seguir" é o da moda. Com a internet, todo mundo "segue" alguém. Que tal seguir o dinheiro? Quem recebeu? Quais seus nomes? Para onde foi a megapropina? Quais os valores exatamente? Os jornais não investigam, vão a reboque das autoridades e ficam só nas declarações, no caso do atual governador paulista, Geraldo Alckmin, por exemplo. O tucano, por sua vez, tenta tirar o Estado de São Paulo do foco da mídia e das investigações ao declarar que o cartel atuou em outros Estados. O governador joga lama no ventilador como forma de justificar o caso. Vamos ver até onde isso vai.

       A ação da imprensa lembra o "estilo Zinho" de jogar bola, é o futebol enceradeira, gira gira e não chega a lugar algum. Ganha-se tempo. Como o ex-presidente Lula no caso do mensalão, Alckmin diz que não sabia de nada e que espera as apurações. Até o momento ia sobrar para o falecido Mário Covas, mas a família dele reagiu.
      
       A corrupção é mesmo uma epidemia no Brasil. A cada dia aparece um caso novo, um pior que o outro: parece que ninguém tem as mãos limpas. No momento, as águas estão bem turvas, tragam mais sabonetes e toalhas, essas não estão dando conta! E a confirmação das penas aos mensaleiros avança... era a última chance de revisão na Justiça. 

       E a trilha sonora é? Se gritar pega ladrão, não fica um, meu irmão...

UMA PERGUNTA PARADA NO AR



Ontem à noite, tomei chope com amigos. Havia um bom tempo que não os via. Muito bom. Como eu, eles gostam de conversar da vida e de política numa mesa de bar [colchetes, a melhor rede social que existe chama-se Mesadybar]. Papo vem, papo vai e o último resultado do Datafolha veio à baila. Afinal, Marina Silva apareceu em segundo lugar, com 26%, na pesquisa de intenção de votos na disputa à Presidência da República, em 2014. Ou seja, a filha dos seringais do Acre tem chances reais de levar. Dilma lidera com 35%, e vai ter que suar muito a camisa para se reeleger. A atual presidente chegou a provar o gostinho amargo do fundo do poço: ela tinha 52% de intenção de votos em dezembro passado (e fingia-se de morta, pra evitar marola) que viraram 30% depois do tsunami dos protestos de junho.
        Muita água ainda vai passar por baixo dessa ponte, mas há uma dúvida no ar. Se a ex-petista Marina vencer [ela tem carisma, feeling político, representa algo novo, é uma espécie do Lula de saia, que veio do povo, mas conseguiu concluir universidade], com quem ela vai governar? Mesmo que consiga legalizar seu partido (Rede Sustentabilidade), como vai emplacar suas ideias no Congresso? Vai ter que fazer alianças. Fará um governo de coalizão?
         Acordei com essa pergunta na cabeça, quarta-feira, 14 de agosto. E aqui no Facebook "esbarrei" num texto do jornalista Carlos Brickmann, que trata do assunto, como ela será cercada pelas mais diversas forças políticas. O endereço é http://ucho.info/a-pergunta-e-a-resposta

terça-feira, 13 de agosto de 2013

MARTE, COM BILHETE SÓ DE IDA



 A Terra parece não ser suficientemente interessante e habitável para milhares de pessoas. Fico me perguntando: para elas, a vida seria um irreversível tédio? E a civilização, nada tem a lhes oferecer para preencher o vazio existencial, exceto o prazer do consumo? Não há nenhuma chance de ser feliz por aqui? O negócio é cair fora? Mesmo que seja preciso fazer o sacrifício de percorrer, no mínimo e na melhor das hipóteses, 56 milhões de quilômetros, em estimados sete meses [210 dias]? Ou, quem sabe, em 90 dias, se derem resultado as pesquisas com combustíveis.

      Digo isso porque li num artigo da BBC que cerca de 100 mil terráqueos já se increveram para uma viagem com destino a Marte. Detalhe, com bilhete só de ida. Trata-se do projeto "Mars One", liderado por um cientista holandês chamado Bas Lansdorp, que pretende colonizar o planeta vermelho a partir de 2023. O custo do projeto interplanetário, segundo os organizadores, é da ordem dos U$ 6 bilhões, incluindo, além do voo propriamente dito, as moradias. O que mais impressiona é saber que só 24 dos inscritos terão essa "oportunidade", única e inédita. Essa jornada está mais concorrida que vestibular: 4.166 candidatos por vaga, de astronauta.

      Fico imaginando como seria a vida em Marte, com apenas 24 "desbravadores". Quantos serão homens, quantas serão mulheres? O que fariam lá? O que comeriam? Com 24 pessoas, não seria necessária a produção de excedentes, a nova humanidade voltaria a viver numa era pré-capitalista? Não haveria dinheiro? Não haveria crimes, assaltos? Sem carro, que bom, sem congestionamentos? Quais seriam as atividades de lazer? E elas dariam conta de criar a sensação de felicidade? E sexo, só para a reprodução [e teríamos o primeiro marciano de verdade]? Ou toda luxúria seria permitida, já que seriam tão poucos os humanos em Marte? Quem seria o líder da comunidade? Haveria um chefe? Seria essa uma oportunidade de criar uma sociedade diferente, ou repetiríamos os mesmos acertos e erros? Como seria a cartilha da sobrevivência e do convívio pacífico? Seria permitido voltar, desistir daquela vida, quando uma eventual segunda leva humana chegasse ao planeta vermelho?

     Tenho a impressão de que todos os 24 da primeira leva adorariam retornar ao planeta azul no primeiro voo que aparecesse por ali, desesperados, depois de um ano vivendo como náufragos em uma ilha deserta. E viriam cantando, "eu voltei, agora pra ficar, aqui é o meu lugar". Isso me lembra uma palestra que assisti numa escola de inglês que organizou uma viagem para a Grã-Bretanha. Eu tinha 14 anos, e meu pai havia dado autorização para minha primeira imersão inglesa. Era como ir para outro planeta. Só que habitado por seres que falam outra língua e -- para mim mais interessante -- onde se escuta rock. O professor falava dos riscos e do modo de ver as coisas dos londrinos. "Olhe para os dois lados antes de atravessar a rua, as mãos são diferentes, não quero trazer ninguém de volta atropelado" etc etc etc etc. Ele descrevia detalhadamente várias situações do cotidiano inglês, quando ouviu-se uma gargalhada. Silêncio rompido, e o professor, embaraçado, perguntou qual era a dúvida. Era algo muito simples, uma provocação. "E se eu quiser tomar um suco de jaca, como devo fazer?", disse um senhor bem-humorado no fundão da sala, para uma nova gargalhada geral.

     Em Marte, pelo projeto, não terá padaria [quanto mais suco de jaca]. Isso já seria o suficiente para a minha desistência. Adoro um pãozinho quente. E se você quisesse comer um churrasco? O clima permitiria homens de sunga e mulheres de biquíni, mesmo sem ter piscina ou mar? E construiríamos um boteco, com mesa ao livre pra bater papo? E a falta de árvores, incomodaria? E a falta de gente?

    A taxa de inscrição para essa jornada é acessível, de US$ 15 a US$ 38 (R$ 60 a R$ 150). Quem se habilita? Diz o organizador que já há gente de 120 países, inclusive do Brasil, sonhando com um outro mundo. Mas nem por um US$ 1 eu trocaria o planeta azul [e sua miséria humana] pelo vermelho [e sua temperatura amena de inverno de até 130 graus negativos].

    Prefiro encher a cara de vinho, caipirinha ou dry martini e viajar para Marte [ou qualquer outro planeta "promissor"] só na imaginação. Que tal bebermos hoje? Que tal uma batidinha, um chope gelado e uma porção de bolinho de bacalhau crocante? Não me venha dizer que há (ou haverá) vida em Marte. Todo mundo sabe que não há. Não, pelo menos, da que gostamos.

  Fonte - Mais de 100 mil se inscreveram para uma viagem sem volta a Marte      


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sexta-feira, 9 de agosto de 2013

DEUS LHE PAGUE




 O 7º andar da Arquidiocese do Rio de Janeiro está movimentado. Não são fiéis em busca da hóstia consagrada ou de uma bênção extra, após a Jornada Mundial da Juventude, católica -- quando milhares de pessoas professando sua fé diante do papa Francisco nas areias de Copacabana. São fornecedores cobrando o pagamento de serviços executados para o evento. Um deles, diretor de uma empresa que instalou tendas, grades e outros equipamentos, declarou que aguarda o pagamento de R$ 800 mil já vencidos, da segunda parcela de R$ 1,4 milhão. A primeira parcela, de R$ 1,5 milhão, foi paga.

     A Igreja alega que a mudança do evento de Guaratiba para Copacabana alterou custos, que renegocia contratos, mas nega a possibilidade de calote. "A Jornada promete honrar todos os seus compromissos", afirmou em nota oficial. Por suas declarações, o diretor da companhia de artigos para eventos parece não estar preocupado em subir aos céus. "Fiz um serviço grande, agora a arquidiocese vem dizer que está com problema de fluxo?... Que o padre venda o carro dele, fiz a minha parte. Não esperava passar por isso. Essa história de Deus lhe pague, não dá", disse.
 
Fonte: Folha de S.Paulo
Firma acusa Jornada da Juventude de dar calote
   

quinta-feira, 8 de agosto de 2013

MELECA DE JORNALISMO

                

Está correndo pela internet, como um rastro de pólvora, um vídeo de seis segundos em que o papa Francisco supostamente tira meleca do nariz e na sequência a coloca na boca, quando sua comitiva estava cruzando avenidas no Rio de Janeiro, na Jornada Mundial da Juventude católica. Se a gravação inteira não for uma fraude (parece mesmo que não é), é no mínimo de um mau gosto tremendo a divulgação dessa imagem. É o que se pode chamar de meleca de jornalismo. O papa não é Deus. Ele urina, defeca, toma banho, come, dorme, sua, fede, passa perfume, votima se passar mal, ri se for engraçado, tropeça se não prestar atenção na escada, reza pelo menos uma vez ao dia, enfim tem suas dores físicas e também dores da alma.
 
      O que mais se pode esperar de um ser humano?
      
Fonte: http://jesusmanero.blog.br/papa-francisco-tira-meleca-do-nariz-e-come/

quarta-feira, 7 de agosto de 2013

DEVOLVAM O MACACO "CHICO"


                      

Imagine um homem que é pego no supermercado furtando um pacote de bolachas para saciar a fome. Ou uma câmera na farmácia que filma uma mãe, com bebê no colo, escondendo na bolsa um remédio que aliviaria a cólica de seu filhote. Ou um pai desempregado flagrado com uma lata de leite em pó que surrupiou, numa gôndola da vendinha do bairro, para estancar o choro famélico da sua filha? Nos três casos os envolvidos, depois de devidamente humilhados, muitas vezes publicamente, seriam detidos e, mais tarde, provavelmente, pagando fiança, liberados pela polícia. Assim a figura do que se chama "estado de necessidade" parece dar conta do efeito, embora não da causa -- a pobreza, a falta de educação e outras mazelas em que o Brasil é pródigo. Pelo menos, assim, que a justiça seja feita. Afinal, não se trata de furto de xampu ou de um relógio Rolex.

     Não fiz direito, mas aprecio situações dífíceis e embaraçosas em que fazer justiça não é algo tão evidente, tão cristalino. Por exemplo: se um homem furta um carro, que está com a janela aberta e a chave no contato num estacionamento, para levar o filho para hospital numa emergência, qual crime ele cometeu? Para mim, nenhum. Só terá de pagar algo, se bateu o carro no caminho. Existe um ditado, em latim, que nunca esqueci e que é aplicável em muitas situações: "Summum jus, summa injuria". Significa "o máximo de justiça pode ser uma grande injustiça". Ou seja, quando um juiz, em determinados casos, aplica a lei ao pé da letra, sem qualquer flexibilidade, ele pode cometer uma tremenda injustiça. E o juiz [acredito, à revelia de outros] existe não só para aplicar a lei, mas sim também para fazer justiça. Porque a gente sabe que nem tudo que é justo é legal, e nem tudo o que é legal é justo.
      
       Aos fatos. Se a justiça dos homens enfrenta dificuldades na mediação de conflitos humanos de toda ordem, pelo menos no Brasil, a coisa parece ficar pior quando envolve as relações entre dois tipos de animais -- nós e os bichos. Um episódio chamou a atenção no noticiário dos últimos dias -- na verdade, desde o último sábado (3 de agosto). Aconteceu em São Carlos, interior paulista. Após denúncia, "Chico", um macaco-prego, foi retirado de uma idosa de 71 anos, Elizete Farias Carmona. Ela contou que cuidava do primata há 37 anos como se fosse um filho -- e chegou a passar mal na hora do cumprimento da ordem judicial, a apreensão do animal pela Polícia Ambiental. "O Chico se agarrou ao pescoço da minha mãe e não queria soltá-la", disse o filho humano de Elizete, que precisou ser levada às pressas a um pronto-socorro, porque sua pressão caiu e ela desmaiou. A família -- que alegou não ter encontrado uma licença ambiental obtida há 20 anos para manter o bicho em casa -- espera que um advogado ajude a recuperar "Francisco Farias Carmona", o nome completo deste macaco, assim batizado pela dona, que declarou ter recebido "Chico" como um presente de um caminhoneiro amigo, vindo de Mato Grosso.
     
        A criação de animais silvestres em cativeiro é proibida por lei federal. O governo, por meio do Ibama (órgão nacional do meio ambiente e recursos naturais), cumpriu sua missão -- com atraso de apenas 37 anos. Trata-se de um crime ambiental que pode valer cadeia por até um ano, além de multa ao criador. Ao pé da letra, Elizete deveria ter sido presa? Ela representa um mau exemplo, dirão, com razão, ecologistas e defensores da fauna. O macaco-prego, também conhecido popularmente por mico, é um dos animais ameaçados de extinção no planeta. É abominável o mercado de animais silvestres. Mas após 37 anos em "convívio familiar", quanto tempo demoraria para ensiná-lo a viver de novo, em bando, na floresta? Ele conseguiria? A vida de um macaco-prego dura cerca de 40 anos. Dois abaixo-assinados na internet pedem a devolução do animal à dona Elizete. Os argumentos são consideráveis. Um deles: "Antigamente era uma prática cultural. A gente sabe que não é o correto, mas ela não fez por maldade, não o maltratou, só quis cuidar”, disse uma das líderes do documento pela volta de "Francisco".

      O macaco-prego é tido como um dos primatas mais inteligentes porque, na natureza, gasta parte do dia procurando ferramentas, como pedras e galhos de árvores, que usa para obter alimentos com mais facilidade. De porte médio, ele pesa entre 1,3 kg e 4,8 kg, e se adapta com rapidez à vida com humanos. O nome deve-se ao formato de prego que tem seu pênis, quando ereto. Até ser apreendido, "Chico" fazia jus ao nome. Segundo a vizinhança, ele adorava mandar beijinhos para as moças.

        O que as moças não sabiam -- aliás, ninguém sabia -- é que "Chico" na verdade é "Chica", segundo os veterinários que examinaram o animal. Que mico!  É claro que, talvez, seja imperativo exigir, como condição de retorno, melhorias nas condições de abrigo do animal no quintal da casa de dona Elizete -- com um recinto maior cercado por tela, para que o macaco fique solto -- assim como deva ser passada uma dieta adequada. Mas, com a licença dos ecologistas e defensores da fauna, summum jus, summa injuria. Neste caso, devolvam "Chica" à sua dona.

[uma semana depois deste artigo ser publicado, a Justiça determinou a devolução do macaco à dona Elizete, condicionando melhorias no abrigo do animal e na alimentação]

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sábado, 3 de agosto de 2013

CRôNICA DO TREM SEM TRILHO 2





O caso da corrupção bilionária que envolve um cartel de companhias multinacionais e autoridades e servidores do governo do Estado de São Paulo, nas licitações de trens da CPTM e do metrô, ganha cada vez mais espaço nas redes sociais, enquanto a grande mídia, ideologicamente comprometida, se mostra inapetente, finge que não vê. Ou gasta tempo, papel e tinta (ou fitas de vídeo) com sofismas tucanas e explicações de quem tenta turvar a água e não quer apurar e esclarecer nada.

    No escândalo do Collor, ao dinheiro sujo lavado no Uruguai dava-se o nome de "sobras de  campanha" (o caixa 2). No mensalão, "gastos não contabilizados". E agora, nas gestões do PSDB, "despesas úteis".

    Reproduzo aqui um trecho de texto do site Diário do Centro do Mundo:

    Na Siemens, subornos eram chamados de “NA”, abreviatura da expressão “nutzliche aufwendungen”, que significa “despesas úteis”. As “despesas úteis” eram movimentadas por funcionários dedicados apenas a isso. Internamente, eram chamados de “consultores”. Quando as autoridades americanas anunciaram a multa bilionária, em 2008, calculava-se que a Siemens empregava no mundo 2.700 “consultores” para administrar seus subornos. As “despesas úteis”, no Brasil, foram largamente empregadas para que a Siemens ganhasse contratos no metrô de São Paulo sob gestões do PSDB.

       PS - Leia também a Crônica do trem sem trilho 1

       Fonte
       Diário do Centro do Mundo - Um personagem central para o esclarecimento do escândalo do metrô de São Paulo

MINHA LISTA DE ESPERA



      
        Amor ou amizade? Essa pergunta me vem à cabeça toda vez que entro no facebook. E não é vontade de participar do famoso quadro do programa Silvio Santos, em que pessoas desconhecidas tentavam a sorte grande de encontrar a outra metade da laranja na televisão, diante de milhões de pessoas, para todo mundo ver e rir. A razão é simples. Consta na minha página -- é assim que se fala na novilíngua -- que existem hoje, por exemplo, 73 pessoas à espera da confirmação de amizade. É uma lista constrangedora. Como posso ter tanta gente próxima ou esquecida no tempo e que eu "abandonei" ao relento nessa relação de nomes e fotos 3x4?
 
        Não é soberba, ou desprezo. É que na internet tudo o que se deixa pra depois se perde no tempo e no espaço. Até e-mails de amigos e parentes. É sempre melhor responder na hora, ou terá que pedir perdão em breve. Por isso, uma vez ou outra, visito essa lista e gasto um tempo fazendo “scroll down” [é mais chique em inglês, em vez de dizer “rolar pra baixo” ou simplesmente “desce”, o cursor] para saber quem ainda se lembra ou gosta de mim por qualquer motivo e quer, com todos os riscos, fazer parte de minha agenda pública no facebook.

        Nessa operação de inclusão – diferente de uma fila para transplante de fígado ou de coração -- não há uma ordem rígida a obedecer na hora do resgate, nem de urgência. Muitas vezes você clica [é como dar um beliscão na vida real] numa pessoa com quem nunca teve uma relação figadal ou com quem nunca lhe falou ao coração ou à mente – por falta de oportunidade ou por outra razão qualquer. Mas é um clique de vida ou morte, virtual. A decisão tomada é definitiva, o nome sai da lista, para o bem ou para mal.

        Essa visitinha à lista de solicitações de amizade, confesso, acho cansativa. Talvez por isso um certo "descaso" de minha parte. É preciso ir de nome em nome, de foto em foto, na busca por velhos e novos amigos, na esperança de que a memória os reconheça, para merecer um clique, o clique da "salvação", ou dos eleitos. O dilema é que essa relação, além de amigos, inclui amigos dos amigos, amigos dos amigos dos amigos, colegas de trabalho, de escola, faculdade, pessoas com outros e diversos interesses, gente com quem tomei umas e outras (a mais ou a menos), com quem conversei (ou dormi) alguma vez e nem me lembro mais, até chegar aos ilustres desconhecidos. Que ficam ali fazendo número, paisagem. Gostaria de saber o que leva uma pessoa, que nunca me viu mais gordo, a pedir para fazer parte de minha relação de amigos... [Será curiosidade mórbida? Não sou tão horrível, mas por beleza é que não é] Em tempo: confesso que já pedi para ser incluído na lista de uma pessoa desconhecida, só pela foto ou porque acompanhei uma conversa e imaginei que podia ser interessante.

        O pior dessa lista de espera, porém, é ouvir de um colega de trabalho, de corpo presente, que você não aceitou sua solicitação de amizade. Ele está lá há meses sem obter resposta: por não reconhecimento do nome correto, por foto muito diferente, por lapso visual, ou porque você raramente entra ali para ver quem te aguarda. Já o melhor dessa imensa agenda pública é reencontrar velhos amigos, saber de suas vidas, reaproximar. Mesmo que as redes sociais tenham se tornado uma espécie de egolândia, onde invariavelmente as pessoas se mostram felizes e completas mesmo que a realidade seja outra. É da coisa humana.

        Amor ou amizade? Só tenho certeza – com o perdão de Roberto Carlos -- que não há como ter  um milhão de amigos para bem mais forte poder cantar. Há quem já tenha 4.999 “amigos”. Parece que o limite do Facebook é 5 mil. Guimarães Rosa escreveu: “Amigo é a gente que a gente gosta de conversar de igual ô igual desarmado”. Milton Nascimento cantou: “Qualquer maneira de amor vale amar, qualquer maneira de amor vale o canto, qualquer maneira de amor valerá”.  
                
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quinta-feira, 1 de agosto de 2013

CRôNICA DO TREM SEM TRILHO 1




      Uma pergunta não quer calar desde que chegou às bancas a revista "IstoÉ" com a reportagem de capa denunciando um esquema de superfaturamento de trens da CPTM e do metrô em 30%,  em São Paulo. Quem se beneficiou desse pagamento de propina? Pelo valor estimado de desvio, pelo menos R$ 425 milhões, pode aparecer gente graúda se a investigação for bem feita. As empresas envolvidas, como a alemã Siemens, formaram um cartel para vencer licitações públicas na área dos transportes durante os últimos 20 anos, ou seja em seguidos governos do PSDB no Estado. A empresa já é ré confessa no caso.
   
      No depoimento voluntário dado por um ex-funcionário da multinacional ao Ministério Público, ele afirmou que houve a participação de autoridades e servidores públicos paulistas. A documentação está com o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica). A Siemens admitiu a existência de um propinoduto. Mas aceitou essa condição de ré em troca de imunidade civil e criminal para a companhia e seus diretores.

     Há suspeita de que o valor de R$ 425 milhões não expresse toda a verdade. As cifras podem ser bem maiores, porque apenas uma parte dos contratos está sendo investigada. Há contratos com valores bem mais elevados. Por exemplo: o valor dos contratos da empresa Alstom, só até 2008, é de R$ 5 bilhões. Sim, a Alstom, a mesma que já foi punida em outros países justamente por pagar propina e corromper autoridades.

     É um escândalo. E a grande imprensa brasileira parece pouco interessada em correr atrás de mais informações, como fez no caso do mensalão. O fato é que é preciso apurar e punir os envolvidos. Por outro lado, para não cair no esquecimento, o Movimento Passe Livre, que liderou recentemente gigantescas manifestações de rua, anunciou que fará panfletagem no dia 6, em vários bairros, convocando a população a participar de um novo protesto, no próximo dia 14 de agosto.

     

DESMANCHE NAS REDAÇÕES




A coisa está feia...

Desta vez foi na Editora Abril. Nos últimos três meses, houve cortes e mais cortes pesados nas redações, de jornalões e revistões. Como está difícil mesmo ser jornalista, pelo menos nesse momento. Nunca neste país houve tantas demissões em um espaço tão curto de tempo. Certamente a massa de demitidos já deve estar na casa dos 500 ou mais, somando tudo desde o início de 2013, que parece querer ser um ano pra esquecer!

A Editora Abril anunciou no final da tarde de 1º de agosto o fechamento das revistas Alfa, Bravo, Gloss e Lola, e a demissão de 150 profissionais, de várias publicações. A empresa tem 6 mil funcionários. Outra medida: a reestruturação de cargos mexeu no comando de várias publicações e unidades de negócio.

Foram demitidos jornalistas experientes, com salários maiores e em funções importantes. Depois sai besteira em reportagens e não se sabe o motivo. Não há tempo para os mais jovens aprenderem com os mais velhos. E a qualidade do que se escreve vai descendo a ladeira em alta velocidade.

Lamentável. Mas previsível. Investir em papel hoje é suicídio. Revistas como Gloss e Lola teriam mais vida se ficassem apenas na internet, mas até a plataforma online foi desprezada na operação desmanche. Nossos filhos não compram revistas e jornais. Está tudo nos sites e nos facebooks da vida. É só dar uma voltinha nos bares de São Paulo e ver a quantidade de celulares de último tipo (ou não) sendo usados pela molecada. As notícias estão no bolso, prontas e disponíveis, em tempo real.

Jornais e revistas podem vender credibilidade na rede. É lá que estão os presentes e os futuros leitores. A Folha já se deu conta disso. Sua nova propaganda na TV expressa o desejo de não naufragar como um barquinho de papel na enxurrada. "Eu sigo a Folha e a Folha me segue", é a novilíngua. Não fala para seus 300 mil leitores em papel. Fala para 6 milhões, no mundo "virtual".