quarta-feira, 30 de setembro de 2015

A GENTE ERA FELIZ! MILICO QUASE ESTRAGA TUDO

Cabo Frio: a ponte Feliciano Sodré, com vão histórico. foi concluída em 1926 e quase demolida pela ditadura militar 
                 

 Diante de pousada em Cabo Frio: minha irmã, papai, eu e a Veraneio
            Megaferiadão em 21 de abril de 1971, plena quarta-feira. Em qualquer feriado era sempre o mesmo ritual. Papai pegava a perua Chevrolet Veraneio azul calcinha e picava a mula rumo a Cabo Frio e Búzios. Em qualquer feriadão, eram 9 horas de estrada. Meu irmão mais velho ia conversando direto com o papai, para que não sentisse sono [o meu irmão, Sérgio como o pai, sempre foi boa prosa]. Primeiro, a gente enfrentava a via Dutra. Depois, como ainda não existia a ponte Rio-Niterói, era preciso contornar a baía de Guanabara pela Rio-Petrópolis até Magé. Brincávamos no caminho, "vai chover até Araruama, depois limpa". Batata, não sei que vento batia naquela região, mas a gente chegava sempre com a noite estrelada. Garantia de sol nos dias seguintes, muito sol aliás. Aquilo, sim, era o paraíso na Terra.
      
               Em Cabo Frio, havia as dunas perto da cidadezinha, e as praias de Peró e Conchas, vazias depois das salinas. Sem uma casa sequer à beira-mar. Almoço às 15h na casa do pescador na ponta da praia: mexilhão com arroz. Em Búzios, a Ferradura era mata até na areia. E a pequena João Fernandes linda linda e água cristalina. Mais a Prainha [ou João Fernandinha], onde minha outra irmã, Flavia, achou, afundada na areia, a chave do carro de um jovem casal de turistas já meio desesperado. Pela incrível sorte, sorte de criança, ela ganhou NCr$ 20 [cruzeiros novos]. "Papai, olha o que eu ganhei!!!" Meu pai rapidamente pediu que ela devolvesse o dinheiro. O que ela topou. Uma aulinha rápida de cidadania.

Conchas: praia onde nao havia nada nem casas nem muita gente

               Pousadas deliciosas e rústicas, chalés, um povo simples e generoso. Em Cabo Frio, lembro-me de dois episódios. Como não havia viva alma nem bar na praia, a gente levava comida e côco verde gelado pra praia do Peró. Não havia como abrir o cocô sem facão, Era um sábado e o açougueiro estava fechando. Ele, então, nos emprestou um facão de seu trabalho, dizendo: "Devolve na segunda". Dito e feito, pode? O outro episódio: um pipoqueiro que vendia cuscus de tapioca doce com côco, maravilhoso, brincava com o meu pai: "Seus filhos são todos paulistas", dizia. Sabe o motivo? "Paulista não pega o saco de pipoca por baixo. Sempre por cima, pra não deixar cair no chão uma pipoca sequer". Um a um pegávamos como ele falara e ele ria: "Está vendo, é fácil reconhecer paulista". O carrinho de pipoca do moço [naquela pracinha perto do canal e da ponte de uma mão só, que tinha sido construída havia quase 50 anos e levava a Búzios] era o mais bem cuidado, pintado de azul e branco. O final de tarde era sempre lá naquela pracinha, sempre o mesmo pipoqueiro. E voltávamos caminhando para a pousada, perto do canal.             
               
              À noite, de repente, um jantar diferente em Rio das Ostras, no "Le Bistrô" de um francês. Ali experimentei minha primeira batida de maracujá, aos 12 anos [uma novidade da época, com a "liberação" do papai, que abriu "exceção"]. E voltávamos para a pousada de Cabo Frio devagar, sem pressa, janelas abertas, brisa no rosto, cantando músicas em coro, com o papai ao volante da perua cantando também. Tempos inesquecíveis. Aquela Cabo Frio não existe mais, Rio das Ostras, acho que também não. Búzios, quem sabe, talvez tenha algum vestígio. O único risco que havia era a brisa constante: sem protetor solar, você podia fritar sem perceber e acabar no hospital.
             
       O dia em que a ponte quase foi derrubada


Título da reportagem sobre a ponte estreita sobre o canal de Itajuru


 "Diário de Notícias" traz nota sobre a ponte em 25 de março de 1973
        
       No início dos anos 1970, no auge da ditadura militar e do "milagre brasileiro", o ministro e coronel Mário Andreazza, dos Transportes, quase demoliu a Ponte Feliciano Sodré, que tinha só uma pista em Cabo Frio. Era preciso esperar o sinal abrir para atravessá-la de carro. Vindo da pracinha de Cabo Frio, à esquerda era o único caminho até Armação de Búzios [ou Búzios] e à direita a rota para as salinas e as praias igualmente virgens e limpas do Peró e Conchas. Para qualquer dos lados, a estrada era de terra, chão batido. [Poeeeeeira, levantou poeira!] A pedido do prefeito, o ministro prometeu uma nova ponte, mas por pouco não derrubou aquela obra antiga tombada pelo patrimônio histórico, concluída em 1926 e que impulsionou a extração de sal na região. Naquela época, Búzios era um "bairro" de Cabo Frio, O jornal "Diário de Notícias" anunciou, em 1973, a construção de uma subprefeitura em Búzios para "atender ao fluxo de progresso daquele distrito".
  
        Destruir a "pontinha" [como a gente chamava] teria sido um crime à história da cidade e à arquitetura [pelo tamanho do vão, inédito]. Seria como demolir a ponte pênsil em São Vicente. Hoje, aliás, a ponte [se não é] deveria ser usada só por pedestres e ciclistas, afinal Cabo Frio é praticamente plana, com vocação fortíssima para as ciclovias. Em 25 de março de 1973, uma reportagem do jornal "Diário de Notícias" dizia claramente que o ministro "autorizou estudos para a construção de uma nova ponte de acesso a Armação de Búzios que substituiria a existente sobre o canal de Cabo Frio". O prefeito da cidade, segundo o jornal, dizia que o Patrimônio Histórico Nacional desejava que a futura ponte fosse "uma réplica da atual", só que maior. O jornal informava também que uma série de reportagens sobre problemas da cidade na alta temporada havia mostrado "o quanto a ponte velha" era "prejudicial" ao crescimento do turismo.

        A ponte escapou por um triz. Uma outra foi feita ao lado. A nova ponte não é uma réplica da antiga e foi entregue em 1983. A ditadura militar acabou em 1985.

                          
Praia da Ferradura (Búzios):onde havia mata, hoje só há casas


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segunda-feira, 28 de setembro de 2015

PARIS: DIA PARA ESQUECER DO PIOR AR DO MUNDO


Domingo sem carro em Paris: milhões a pé ou de bicicleta tomaram as avenidas como a que leva ao Arco do Triunfo
De manhã bem cedo: ninguém nas ruas fechadas a veiculos
Namoro na bici: sem carro, segurança total


             Um grande sucesso. Milhares de pessoas nas ruas. A iniciativa de "Um dia sem carro", promovida pela prefeitura de Paris, baniu os veículos do centro expandido e de áreas residenciais nobres da capital francesa. Na região situada entre o Palácio da Bastilha e o Arco do Triunfo, no perímetro de pontos turísticos como a Torre Eiffel e em outras partes da cidade, das 11h às 18h, os carros não puderam circular. Dentro dessas áreas só foi permititida a circulação de veículos oficiais e automóveis em casos de emergência -- mesmo assim com a velocidade máxima de 20 km/h. Nas demais regiões, fora das zonas determinadas, mas próximas às ruas fechadas aos carros, houve redução dos limites de velocidade para "inacreditáveis" 30 km/h [imagine isso em São Paulo!].

           “É uma ótima ideia. É talvez a primeira vez que eu vejo a Champs-Élysées sem carros assim. A última vez que estava assim, tão cheia de gente, foi durante a Copa de 1998”, afirmou um morador. Pais e crianças passearam no meio na avenida dos Champs-Élysees, uma das mais caras de Paris. “É uma boa forma de as pessoas poderem explorar a cidade em outra perspectiva. Geralmente os carros dominam as ruas, em vez das pessoas. Em uma cidade como Paris, onde pouca gente tem carro e está sempre cheia de turistas, faz sentido dar as ruas de volta às pessoas pelo menos um pouco”, disse outro pedestre.  Locais sempre bastante movimentados, como a praça da Bastilha, viraram paraíso para ciclistas. Com boa parte dos carros de Paris é movida a diesel, em março, uma nuvem espessa de partículas fez a cidade se tornar, mesmo que por instantes, a mais poluída do mundo. Ou seja, ter o pior ar do planeta.

           Mas o fato de "Um dia  sem carro" acontecer num domingo [ontem, dia 27] foi alvo de críticas de ambientalistas. A prefeitura parisiense, segundo eles, achou uma forma de não entrar em conflito com quem realmente usa diariamente veículos a motor. Em São Paulo, o Ministério Público tenta barrar a iniciativa de se fechar [nem que fosse uma vez a cada 30 dias, por exemplo, no primeiro domingo de cada mês] a Avenida Paulista. Claro que há fortes ingredientes políticos nessa história. Em 2016, teremos eleição municipal e a oposição busca "qualquer coisa " para falar mal do prefeito. A discussão aqui é outra. Enquanto as autoridades francesas e as entidades não-governamentais debatem um plano estratégico para uma "Paris inteligente e durável", aqui em São Paulo a questão é se a ciclovia é coisa de pequeno burguês ou não etc. Claro que São Paulo não é uma cidade com vocação para a bicicleta como têm muitas cidades europeias ou brasileiras, como Macapá, Joinville e outras centenas de cidades planas do país. Mas está mais do que na hora de discutir como São Paulo deverá andar no futuro. Antes que trave de vez.

Na beira do Rio Sena: só patins e bicicletas 
Ciclistas, triciclos e carrinhos de bebê: boa parte da frota de Paris é movida a diesel, o que gera alta poluição do ar

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KOBANI VIVE SOB O TERROR DO ESTADO ISLÂMICO

Notícias sobre mortes no Mar Egeu assustam e milhares de sírios curdos tentam voltar a Kobani, perto da Turquia
Kobani em ruínas: americanos bombardeiam postos do Estado Islâmico










    






        Em Izmir, à beira do Mar Egeu, na Turquia, um dos sírios que tentava fugir para a Grécia foi claro. Prefere morrer afogado a viver sob o comando do Estado Islâmico. "Em Raqqa, a vida não é sua, é deles. Você tem que obedecer ou morre. Lá você sente a morte de perto", disse o refugiado à BBC, semanas atrás. O depoimento do rapaz publicado neste blog [veja link no final deste texto]. Mas um efeito perverso tem causado agora a volta de milhares de sírios a Kobani, Você duvida? Na fronteira entre Kobani e Suruç, também na Turquia. cerca de 100 pessoas fogem por semana, mas 4 mil já retornam e desistem do êxodo, assustadas com as notícias de centenas de mortes nas tentativas de travessia nos mares Egeu e Mediterrâneo. Aí, muitas delas pagam um preço. São massacradas pelo grupo extremista Estado Islâmico.

       A jornalista Patrícia Campos Mello, enviada à Síria, pela Folha, relata um desses epsódios. Foi o que aconteceu com 12 pessoas de uma mesma família. Berivan Hassan, funcionária pública, em 25 de junho passado teve sua casa invadida por extremistas em Kobani, disfarçados de soldados da milícia curda YPG, que combate o Estado Islâmico. Ela estava em casa quando ouviu um barulho. O irmão saiu para ver o que estava acontecendo e foi assassinado. A mulher dele, foi socorrê-lo e também morreu. A mãe quis ajudar e foi morta. Os milicianos do Estado Islâmico invadiram, então. a casa atiraram na mulher de outro irmão de Berivan, que levava no colo o filho de 2 meses. A criança sobreviveu, mas a mãe morreu diante do outro filho, de dois anos. Mataram mais dois irmãos, um tio e cinco parentes dela.

   
       Naquela noite, massacraram 258 civis na cidade. Berivan já tinha perdido o pai em 2013, por causa de um carro bomba do Estado Islâmico, no centro de Kobani, e uma irmã, que morreu no front em 2014. Hoje, ela e os três irmãos que sobraram cuidam de seis sobrinhos órfãos, com idades entre 4 meses e 15 anos. Traumatizada com a guerra, Berivan pensou em fugir da Síria. Mas mudou de ideia. "Depois de toda a minha família ter se sacrificado, não tenho o direito de ir embora." Assim como Berivan, muita gente desistiu de emigrar para a Turquia ou Europa e preferiu voltar para casa.


      Segundo Ismet Mohammed, 48 anos, administrador da fronteira entre Kobani e Suruç, Turquia, cerca de 4.000 sírios por semana estão voltando da Turquia e só 100 fazem o trajeto inverso."As pessoas viram muita gente morrendo no mar, assustaram-se e chegaram à conclusão de que ir para a Europa não é a solução. Elas precisam reconstruir a Síria", disse Mohammed.


       A reconstrução será uma tarefa gigantesca. Entre setembro de 2014 e janeiro de 2015, durante o cerco do Estado Islâmico, a luta contra os extremistas e subsequentes bombardeios aéreos dos americanos para liberar Kobani destruíram 70% da cidade. Hoje, grande parte dos habitantes mora em ruínas. |O agricultor Ismail Bilal é um dos que fugiram para a Turquia e decidiram voltar. Ao chegar a Kobani, ele se deparou com sua casa destruída. Hoje, Ismail e a família de dez pessoas dormem ao ar livre, no espaço onde um dia foi sua cozinha. Só sobrou um cômodo da casa de pé. Ismail está desempregado, e a única filha que trabalhava, de 16 anos, hoje está no YPJ, o Exército feminino. "Não vou embora, é a minha cidade. Tenho fé que as coisas vão melhorar."


       Apesar do fluxo de volta, dos 130 mil habitantes de Kobani, só estão na cidade 35 mil. O cantão chegou a ter 350 mil, e hoje só tem 100 mil. A falta de empregos é o maior desafio. Na última quarta, dia 23, Ahmed Mustafa, de 17 anos, estava na fronteira da Síria esperando para cruzar para a Turquia. De lá, ele ia pagar US$ 200 para um coiote levá-lo até o Curdistão iraquiano, atravessando um rio clandestinamente, com água pelo pescoço. "Aqui eu ganho no máximo US$ 100, e lá, US$ 800 por mês trabalhando em construção", justificava.Segundo Bozar Khalil, ministro do Interior do cantão de Kobani, o governo está fazendo um mutirão, empregando na reconstrução da cidade muitos dos habitantes que retornam. "Alguns estão traumatizados com os massacres e não vão voltar", diz.

    
      O Estado Islâmico ainda está em Sarrin,  cidade a apenas 40 km de Kobani. "Este front é crítico", afirma o comandante Mirhaz Botan, em um dos postos do YPG. "O Estado Islâmico montou um centro onde está treinando cem meninos a partir de 14 anos. "Os curdos do YPG trabalham em conjunto com os americanos, passando a eles coordenadas de GPS de onde estão os militantes do Estado Islâmico para que a coalizão bombardeie. Os soldados ouvem o barulho dos jatos americanos e brincam, olhando para cima, usando a palavra curda para "camarada": "Heval Obama!". 

     A maioria dos vilarejos está deserto, pois todos os civis fugiram. Por todo lado, veem-se placas vermelhas com uma caveira, indicando a existência de minas. Os habitantes de Kobani tentam se adaptar a uma vida sob ameaça constante. Shireen Misko, 15, mora numa casa sem móveis – foi tudo queimado pelo Estado Islâmico -- para fazer fumaça e atrapalhar os ataques aéreos americanos. Ela mexe na AK-47, apoiada no chão, com a desenvoltura de quem comenta a novela de Hollywood. "Meu sonho é ser cientista, mas talvez eu entre no YPJ para proteger minha família", diz. "Nossa vida virou de cabeça para baixo. Enquanto a maior preocupação das meninas na Europa é ter namorado ou não, eu não sei se o Daesh [sigla em árabe para o Estado Islâmico] vai voltar amanhã e me matar." 





Mulheres do YPJ; aderem à resistência contra o Estado Islâmico


Leia mais sobre a crise migratória
REFUGIADOS; A FACE DO HORROR HUMANO

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sexta-feira, 25 de setembro de 2015

PAPA: "QUER SER GRANDE? SIRVA AOS OUTROS"

      

O papa Francisco ao chegar na Praça da Revolução, em Havana

      Francisco, o papa do povo, rezou missa na Praça da Revolução, em Havana, para cerca de 100 mil fiéis. Foi o desfecho de sua viagem à Cuba. Na cerimônia de despedida, o papa leu a homilia em que defendeu o olhar para o outro, o servir ao outro. "A importância de um povo, de uma nação, a importância de uma pessoa sempre se baseia no modo como serve à fragilidade dos seus irmãos. Nisto, encontramos um dos frutos da verdadeira humanidade". Depois embarcou para os Estados Unidos, onde pela primeira vez um papa discursou no Congresso. A seguir, a íntegra da nova homilia papal, apresentada na capital cubana:

     O Evangelho apresenta-nos Jesus fazendo aos seus discípulos uma pergunta aparentemente indiscreta: "Que discutíeis pelo caminho?" (Mc 9, 33). Uma pergunta que Ele nos pode fazer também hoje: De que é que falais diariamente? Quais são as vossas aspirações? Eles "ficaram em silêncio – diz o Evangelho – porque, no caminho, tinham discutido uns com os outros sobre qual deles era o maior". Os discípulos tinham vergonha de dizer a Jesus aquilo de que estavam a falar. Nos discípulos de ontem, como em nós hoje, pode-se encontrar a mesma discussão: Quem é o mais importante?
  
      Jesus não insiste com a pergunta, não os obriga a dizer-Lhe o assunto de que falavam pelo caminho; e, todavia, a pergunta permanece, não só na mente, mas também no coração dos discípulos.

      Quem é o mais importante? Uma pergunta que nos acompanhará toda a vida e à qual somos chamados a responder nas diferentes fases da existência. Não podemos fugir a esta pergunta; está gravada no coração. Mais do que uma vez ouvi, em reuniões de família, perguntar aos filhos: De quem gostas mais, do pai ou da mãe? É como se vos perguntassem: Quem é mais importante para vós? Será que esta pergunta é simplesmente um jogo de crianças? A história da humanidade está marcada pelo modo como se respondeu a esta pergunta.

       Jesus não teme as perguntas dos homens; não tem medo da humanidade, nem das várias questões que a mesma coloca. Pelo contrário, Ele conhece os "recônditos" do coração humano e, como bom pedagogo, está sempre disposto a acompanhar-nos. Fiel ao seu estilo, assume os nossos interrogativos, aspirações, conferindo-lhes um novo horizonte. Fiel ao seu estilo, consegue dar uma resposta capaz de propor novos desafios, descartando «as respostas esperadas» ou aquilo que aparentemente já estava estabelecido. Fiel ao seu estilo, Jesus sempre propõe a lógica do amor; uma lógica capaz de ser vivida por todos, porque é para todos.

      Longe de qualquer tipo de elitismo, Jesus não propõe um horizonte para poucos privilegiados, capazes de chegar ao «conhecimento desejado» ou a altos níveis de espiritualidade. O horizonte de Jesus é sempre uma proposta para a vida diária, mesmo aqui na «nossa ilha»; uma proposta que faz com que o dia a dia tenha sempre o sabor da eternidade.

      Quem é o mais importante? Jesus é simples na sua resposta: «Se alguém quiser ser o primeiro, há de ser o último de todos e o servo de todos» (Mc 9, 35). Quem quiser ser grande, sirva os outros e não se sirva dos outros.

       Aqui temos o grande paradoxo de Jesus. Os discípulos discutiam sobre quem deveria ocupar o lugar mais importante, quem seria selecionado como o privilegiado, quem seria isento da lei comum, da norma geral, para se pôr em evidência com um desejo de superioridade sobre os demais. Quem subiria mais rapidamente, ocupando os cargos que dariam certas vantagens.
Jesus transtorna a sua lógica, dizendo-lhes simplesmente que a vida autêntica se vive no compromisso concreto com o próximo.

       O convite ao serviço apresenta uma peculiaridade a que devemos estar atentos. Servir significa, em grande parte, cuidar da fragilidade. Cuidar dos frágeis das nossas famílias, da nossa sociedade, do nosso povo. São os rostos sofredores, indefesos e angustiados que Jesus nos propõe olhar e convida concretamente a amar. Amor que se concretiza em ações e decisões. Amor que se manifesta nas diferentes tarefas que somos chamados, como cidadãos, a realizar. As pessoas de carne e osso, com a sua vida, a sua história e especialmente com a sua fragilidade, são aquelas que Jesus nos convida a defender, assistir, servir. Porque ser cristão comporta servir a dignidade dos irmãos, lutar pela dignidade dos irmãos e viver para a dignificação dos irmãos. Por isso, à vista concreta dos mais frágeis, o cristão é sempre convidado a pôr de lado as suas exigências, expectativas, desejos de onipotência.

Há um «serviço» que serve; mas devemos guardar-nos do outro serviço, da tentação do «serviço» que «se» serve. Há uma forma de exercer o serviço cujo interesse é beneficiar os «meus», em nome do «nosso». Este serviço deixa sempre os «teus» de fora, gerando uma dinâmica de exclusão.

Todos estamos chamados, por vocação cristã, ao serviço que serve e a ajudar-nos mutuamente a não cair nas tentações do «serviço que que se serve». Todos somos convidados, encorajados por Jesus a cuidar uns dos outros por amor. E isto sem olhar em redor, para ver o que o vizinho faz ou deixou de fazer. Jesus diz: «Se alguém quiser ser o primeiro, há-de ser o último de todos e o servo de todos» (Mc 9, 35). Não diz: Se o teu vizinho quiser ser o primeiro, que sirva. Devemos evitar os juízos temerários e animar-nos a crer no olhar transformador a que Jesus nos convida.
Este cuidar por amor não se reduz a uma atitude de servilismo; simplesmente põe, no centro do caso, o irmão: o serviço fixa sempre o rosto do irmão, toca a sua carne, sente a sua proximidade e, em alguns casos, até «padece» com ela e procura a sua promoção. Por isso, o serviço nunca é ideológico, dado que não servimos a ideias, mas a pessoas.

O santo povo fiel de Deus, que caminha em Cuba, é um povo que ama a festa, a amizade, as coisas belas. É um povo que caminha, que canta e louva. É um povo que, apesar das feridas que tem como qualquer povo, sabe abrir os braços, caminhar com esperança, porque se sente chamado para a grandeza. Hoje convido-vos a cuidar desta vocação, a cuidar destes dons que Deus vos deu, mas sobretudo quero convidar-vos a cuidar e servir, de modo especial, a fragilidade dos vossos irmãos. Não os transcureis por causa de projetos que podem parecer sedutores, mas desinteressam-se do rosto de quem está ao teu lado. Nós conhecemos, somos testemunhas da «força imparável» da ressurreição, que «produz por toda a parte, gerando rebentos de um mundo novo» (Exort. ap. Evangelii gaudium, 276.278).

Não nos esqueçamos da Boa Notícia de hoje: a importância de um povo, de uma nação, a importância de uma pessoa sempre se baseia no modo como serve a fragilidade dos seus irmãos. Nisto, encontramos um dos frutos da verdadeira humanidade.


Francisco usa o papamóvel e acena para a multidão nas ruas de Havana

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quinta-feira, 24 de setembro de 2015

O MUNDO DIGITAL É CADA DIA MAIS "SELF-AGEM"

Selfie: em teste para pagar conta de cartão de crédito nos EUA

        Prepare-se. Haverá o dia em que a geladeira só vai abrir em um piscar de olhos. No caso, o seu. Cada coisa inimaginável o homem é capaz de fazer para não fazer esforço. Ou ainda, a lei do mínimo esforço pode ser o caminho mais seguro a percorrer, principalmente no mundo digital. Assim é que os bancos -- aquelas instituições que só têm lucros estratosféricos aconteça o que acontecer --- tentam convencer o cliente de que seu sistema é confiável. Com o aumento do risco de roubo de dados, as formas de proteção vão agregando métodos novos, além dos números, das senhas e outros modos tradicionais de conferir se "alguém é ela mesma".
                
          Ultimamente, a identificação biométrica, aquela que usa as características físicas de cada pessoa para permitir o acesso à conta bancária, tem sido muito pesquisada. A impressão digital -- que também é usada em entradas de condomínios [mesmo com falhas] --- é a mais conhecida, mas não é o único jeito de cadastrar pessoas. Hoje em dia os computadores são capazes de reconhecer a rosto, a íris dos olhos de um morador ou cliente, o formato das orelhas, a geometria das mãos e a voz de uma pessoa  A gente começa a fazer uso [e até ironizar a utilização] desses identificadores e os tornamos tão corriqueiros que nem nos damos conta, como colocar a mão no leitor ótico do caixa eletrônico para sacar dinheiro ou pagar uma conta. Entra tudo no "automático". É como andar, pedalar, escovar os dentes. No Brasil, por exemplo, já há 90 mil caixas eletrônicos de banco com sensores.

          O smartphone, que tornou o celular "mais que tudo", vai ganhar em breve mais uma função. Nos Estados Unidos, o cartão de crédito MasterCard iniciou testes onde uma "selfie" [uma foto de si próprio, aquele exercício de egocentrismo que o mundo digital atiçou] é usada para realizar pagamentos. Nessa hora, o cliente não digitará mais senhas, vai tirar uma foto da própria face com o celular e um aplicativo da operadora de cartão de crédito fará a identificação. Tudo nos "trinques", claro porque -- se na porta de um condomínio residencial a impressão digital dos dedos pode falhar porque há porteiros conferindo -- no caso dos bancos essa possibilidade tem que ser igual a zero.
         
         Essa novidade, acredito, deve durar pouco. Mas o que dura muito no mundo digitalizado? O mundo digital é cada dia mais "self-agem". E como sempre existirá alguém querendo burlar o sistema [seja para proveito próprio ou só pelo prazer de mostrar a vulnerabilidade], o primeiro desafio da "selfie-conta" será convencer o cliente que se dar ao trabalho de tirar uma foto para pagar o cartão de crédito vale a pena e realmente é seguro. De qualquer forma, quem diria no passado que usaríamos cartão de débito ou crédito na feira, no posto, no supermercado, em qualquer lugar enfim, para pagar nossas compras? No varejo, as soluções com biometria vão ser cada vez mais utilizadas na abertura de crediários, onde são comuns as fraudes com documentos falsos. Embora não esteja livre de falhas, a biometria reduz muito a chance de falsificações, pelo menos nos níveis em que elas existem hoje.

      Portanto, "selfie-se quem puder" mesmo. Neste caso, porém, creio que ninguém vai conseguir se "selfar" -- exceto se ficar, por opção ou imposição, excluído do sistema.

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domingo, 20 de setembro de 2015

BOTSUANA TROCA LEÕES MORTOS POR BANHEIROS

        
Cecil, 13 anos, leão mais conhecido da África: morte causou indignação



Walter Palmer: prazer em matar
















          Deu no "NYT".  Leões passaram a surgir furtivamente das matas para arrebatar bodes no meio da aldeia. Elefantes também se tornaram visitantes frequentes, devorando o feijão, o milho e as melancias cultivados pelos agricultores.  Desde que Botsuana proibiu a caça esportiva, há quase dois anos, comunidades remotas como Sankuyo estão à mercê de um número crescente de animais selvagens.  A proibição também levou a uma queda acentuada na renda, já que os aldeões usavam o dinheiro dos caçadores para construir casas e banheiros e dar pensão aos idosos.

[Inacreditável, quantos banheiros valem um leão morto? Quantos elefantes abatidos pelo prazer de um caçador valem uma casa?  E quantos impalas mortos valem uma pensão de idoso...  É a miséria humana ao cubo. Que método mais esdrúxulo de promover o bem-estar social]          

          Os clamores pela proibição da caça esportiva em toda a África aumentaram desde que um leão no Zimbábue, chamado de Cecil por pesquisadores que o rastreavam, foi morto em julho por um dentista americano, Walter Palmer. Com isso, várias companhias aéreas pararam de transportar troféus de caça. No entanto, muitas comunidades rurais estão pedindo a retomada da caça. "Antes, quando havia caça, nós queríamos proteger esses animais porque podíamos ganhar alguma coisa com eles", disse Jimmy Baitsholedi  Ntema, aldeão na faixa dos 60 anos. "Agora não podemos mais tirar proveito deles. Os elefantes e búfalos destroem nossas plantações de dia. À noite, os leões entram em nossas aldeias."

[Curioso, entendo o argumento de que os animais silvestres não têm limites geográficos. Buscam comida onde ela é farta e fácil. Mas o que o aldeão diz é “guardamos o leão para o abate”, na prática não está protegendo nada. As populações de felinos selvagens vêm diminuindo no mundo todo. Nesse ritmo em poucas décadas, leões só serão vistos em filmes antigos ou documentários de TV]

         No início de 2014, Botsuana se tornou uma das poucas nações africanas com vida selvagem abundante a dar fim à caça esportiva, em grande parte devido às iniciativas conservacionistas no sul da África. O presidente Seretse Khama Ian Khama afirmou que a caça não era mais compatível com a conservação da vida selvagem e que devia haver mais incentivos ao turismo meramente fotográfico. A decisão foi saudada por grupos de defesa dos animais no Ocidente.

[A alegria pela defesa dos animais durou pouco]

         Botsuana, porém, é uma exceção honrosa. Autoridades e conservacionistas na maioria dos países africanos são a favor da caça esportiva, incluindo Zâmbia, que está recuando após uma breve suspensão da atividade. "A caça existe aqui desde épocas remotas", disse Jean Kapata, ministra do Turismo. Recentemente, Zâmbia suspendeu uma proibição decretada há dois anos à caça de leopardos, e a caça de leões deve ser retomada no próximo ano. Em 2013, o país reprimiu a caça esportiva e impôs uma proibição total à caça de grandes felinos, igualmente a fim de substituir essas práticas pelo turismo fotográfico. Isso, porém, gerou pouca renda, afirmou Kapata, ao passo que leões passaram a atacar cada vez mais os rebanhos. Durante a proibição, um membro do conselho local foi morto por um leão, comentou ela.

[Gravíssimo, uma pessoa foi morta por um leão. Isso não teria acontecido se a caça estivesse permitida? Para se defender, a pessoa não pode matar um leão? É como o tigre na Índia que, cada vez mais perto da civilização, busca comida fácil. Mas as terras onde ele vivia foram ocupadas pelo homem. A discussão não é quem vale mais um leão ou tigre e o homem. É como evitar essa proximidade tão perigosa para o homem. A questão é como não dizimar uma espécie animal].

        "Na África, um ser humano é mais importante que um animal", declarou Kapata. "Não sei se isso é diferente no mundo ocidental", acrescentou, ecoando uma queixa em partes da África de que o Ocidente parece se importar mais com o bem-estar de um leão do que com os próprios africanos. O recuo de Zâmbia indica o papel central que a caça esportiva ocupa no manejo da vida selvagem no sul da África. Essa atividade de lazer ocorre principalmente em terras comunitárias cujas aldeias devem receber uma parte das taxas pagas pelos caçadores.

[Coincidência, onde entra dinheiro... a população quer a volta da caça esportiva, aquela feita pelo prazer de matar um animal selvagem e tê-lo como troféu em casa]

          Sankuyo, aldeia com 700 habitantes, fica no leste do delta do Okavango, no norte de Botsuana. Em 2010 ela ganhou quase US$ 600 mil pelos 120 animais -- incluindo 22 elefantes, 55 impalas e nove búfalos -- que ofereceu aos caçadores naquele ano, relatou Brian Child, professor-adjunto na Universidade da Flórida, que está à frente de um estudo sobre o impacto da proibição. Entre os benefícios para a comunidade, 20 lares escolhidos por sorteio ganharam banheiros externos. Piezômetros foram instalados em pátios levando água corrente para 40 famílias.  Gokgathang Timex Moalosi, 55, chefe de Sankuyo, disse: "Nós dissemos a eles que aquele leão ou elefante foi quem pagou pelos banheiros".
        
          Segundo especialistas, quando a caça esportiva beneficia comunidades, as pessoas ficam mais motivadas a proteger a fauna. Por outro lado, na maioria dos lugares sem a caça esportiva, os animais selvagens são considerados um incômodo ou um perigo, e os moradores são mais propensos a caçá-los para se alimentar ou a matá-los para defender suas casas e plantações.

 [Então, está bem, vamos matar leões e elefantes até dizimar suas populações, assim teremos mais banheiros. A lógica perversa, em vez de tirar os leões dessas áreas periféricas e transferi-los,  monitorando suas populações, só autorizando a caça de excedentes]

           Child disse que a caça esportiva não beneficiou muitas comunidades devido à má gestão e à corrupção. Porém, nos países onde a atividade funcionava bem -- Botsuana (até a proibição), Namíbia e Zimbábue (até seu colapso econômico na década passada)  --, as metas de gerar renda e proteger animais selvagens haviam sido alcançadas. "Na realidade, isso trouxe uma diminuição no número de animais mortos", disse Child.

[Quem sabe em breve, Child, um pesquisador desinteressado, será visto matando leões em Botsuana, para explicar como deve funcionar para que os animais sejam protegidos e ele possa ter alguns troféus em casa]

            Os leões, que costumavam se banquetear com carne de elefantes deixados para trás por caçadores, estão cada vez mais entrando em aldeias à procura de animais criados para subsistência. "Está havendo um aumento exponencial de conflitos entre animais e seres humanos", disse Israel Khura Nato, diretor da unidade de controle do Departamento de Vida Selvagem em Botsuana. Segundo o departamento, tais conflitos em todo o país aumentaram de 4.361 em 2012 para 6.770 em 2014. Os incidentes devido à caça ilícita aumentaram de 309 em 2012 para 323 em 2014. Galeyo Kobamelo, 37, contou que desde a proibição perdeu todos os 30 bodes na propriedade de sua família para leões e hienas. Elefantes destruíram suas plantações de sorgo e milho. A família não conta mais com a carne grátis deixada pelos caçadores e sua mãe parou de receber a pensão. Moalosi, o chefe de Sankuyo, disse que espera recuperar alguns benefícios depois que sua aldeia fizer uma transição bem-sucedida para o turismo fotográfico.

[Ah, sim, ficou claro agora. Os leões só passaram a entrar nas aldeias porque pararam com a matança de elefantes cuja carne deixada para trás pelos caçadores era seu prato predileto. Então, que voltem a trucidar elefantes só para pegar os dentes de marfim, deixando a resto para os felinos vorazes]

         Na opinião de especialistas, porém, turistas contemplativos circulam mais em áreas com grande densidade de vida selvagem, como a Reserva Moremi no delta do Okavango, a oeste daqui. Raramente eles se aventuram por áreas periféricas como Sankuyo, justamente as que atraem caçadores. Em Sankuyo, William Moalosi está entre as dezenas de pessoas desempregadas devido à proibição. Ele trabalhava como rastreador e motorista e ganhava cerca de US$ 100 por mês.

         Aldeões identificaram Moalosi, 40, como o homem que matou uma leoa no mês passado. O animal havia invadido uma aldeia que tinha bodes. Moalosi, porém, disse que nada sabe sobre isso, o que provocou sorrisos coniventes de seus vizinhos. "Nós vivemos com medo desde que leões e leopardos passaram a vir à nossa aldeia", disse. "Elefantes cruzam a aldeia para ir ao outro lado da mata. Os cães latem para eles e nós corremos para nos esconder em casa."

[Conclusão: deixem matar leões, elefantes, búfalos e impalas à vontade porque assim todos ganham e as pessoas terão mais vontade de defendê-los para poder, no futuro breve, fazer cocô e xixi em banheiros, não no chão no meio da mata]

* O texto [que comento] foi publicado pelo jornal "The New York Times"

Caça enlatada: leão que teria sido criado em cativeiro, morto por caçadores

PS - A África do Sul estaria tirando das leoas alguns de seus filhotes e criando-os em cativeiro para depois serem abatidos por caçadores a preço de ouro. Esse seria o preço da "preservação" de leões. A essa prática é dado o nome de "canned" ou "caça enlatada".


Leia mais sobre a caça de animais
COSTA RICA DISSE NÃO À CAÇA "ESPORTIVA"


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sexta-feira, 18 de setembro de 2015

EFEITO DOMINÓ: CROÁCIA FECHA A FRONTEIRA

              
Desespero: refugiados e migrantes tomam trem rumo à Eslovênia, que tem devolvido migrantes à Croácia 
              Polícia eslovena vigia migrantes 
Croácia fecha a fronteira: medida irrita a Sérvia

             Três dias depois de virar rota alternativa para os refugiados sírios e milhares de migrantes que rumam a países ricos da União Europeia, a Croácia fechou os postos de fronteira com a Sérvia e anunciou que não receberá mais pessoas. Após a Hungria erguer uma cerca de 176 km na fronteira com a Sérvia e fechar as portas aos migrantes, as autoridades croatas estimam que cerca de 14 mil estrangeiros entraram em seu território. 
  
          Com a decisão croata, foram fechadas todas as passagens de fronteira entre a Croácia e a Sérvia exceto o posto de Bajakovo, na estrada que liga as capitais dos dois países. Mas desesperados os refugiados, que incluem crianças de colo e cadeirantes, continuam entrando no país por campos abertos, sem usar as rodovias. O primeiro-ministro croata, Zoran Milanovic, que havia dito na quarta-feira (16) que seu país estava "pronto para aceitar e direcionar" os refugiados. Uma reunião do Conselho Nacional de Segurança, porém, mudou a forma de lidar com o problema. "Não podemos mais registrar e acomodar essas pessoas. Eles terão acesso a comida, água e assistência médica, depois podem prosseguir sua viagem. A União Europeia deve reconhecer que a Croácia não se tornará um foco de migrantes. Nós temos corações, mas também temos cabeças."

           A mudança de atitude da Croácia irritou o governo da Sérvia, que teme que milhares de migrantes e refugiados, impedidos de entrar na União Europeia, acabem ficando no país. O ministro de assuntos sociais da Sérvia, Aleksander Vulin, disse que o país deve denunciar a Croácia a tribunais internacionais, caso as passagens de fronteira permaneçam fechadas. Ele argumenta que o país vizinho deveria ter se preparado para o grande fluxo de pessoas. "Não pagaremos o preço da incapacidade alheia", disse Vulin. "Lamento que a humanidade e solidariedade da Croácia tenham durado dois dias."
  
          A Croácia tem direcionado muitos dos migrantes que entraram em seu território para a Eslovênia e a Hungria para que continuem sua viagem. A maioria deles tenta encontrar asilo em países mais ricos, como a Alemanha, que prevê receber até 1 milhão de pessoas em 2015. O tráfego de trens entre Croácia e Eslovênia foi interrompido, e muitas das pessoas que chegam a este país têm sido forçadas a retornar ao território croata.

          A Hungria anunciou que iniciou a construção de uma cerca provisória de 41 km de extensão na divisa com a Croácia. "Durante a noite começaram as obras para o bloqueio da fronteira. Parece que não podemos contar com a ajuda de ninguém", declarou o primeiro-ministro húngaro, Viktor Orban. Segundo a polícia, 453 migrantes entraram ilegalmente na Hungria a partir da Croácia na quinta-feira. Centenas de soldados e policias húngaros foram encaminhados à região fronteiriça para impedir a passagem irregular de pessoas. A Europa vive uma crise migratória sem precedentes.  Segundo o Alto-Comissariado das Nações Unidas para Refugiados mais de 411 mil pessoas atravessaram o Mediterrâneo para tentar entrar na Europa desde o início do ano.

Leia mais sobre a crise migratória 

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quinta-feira, 17 de setembro de 2015

EXTINTO EXTINTOR DE CARRO: ESTRANHA MEDIDA



    Extintor de incêndio: o vaivém da obrigatoriedade

           O extintor de incêndio deixa de ser item obrigatório nos carros nos próximos dias. Três meese depois que o Contran (Conselho Nacional de Trânsito) determinou que até carros com mais de 10 anos de uso deveriam trocar de extintor (de BC para ABC) no começo deste ano, o órgão decidiu hoje [quinta, 17] que o item não será mais obrigatório nos veículos que circulam no país. A medida passa a valer assim que a decisão for publicada no "Diário Oficial da União", o que deve acontecer até segunda-feira. O uso será opcional para carros, utilitários, caminhonetes e triciclos de cabine fechada. Até agora andar sem extintor ou com ele vencido era infração média, com multa de R$ 127,69 e cinco pontos na carteira. A obrigação do uso do extintor existe desde 1970. O extintor permanece obrigatório em caminhões, microonibus, ônibus, tratores e veículos de transporte de produtos inflamáveis. Ainda bem, não é?

             Não faz nem uma semana que troquei o extintor, por R$ 156 reais. O meu estava vencido. Tudo bem, por motivo de segurança, acho que trocaria do mesmo jeito. Mas o que houve, é loucura atrás de loucura. Isso me faz lembrar do kit de primeiros socorros obrigatório. Todo mundo comprou com medo da multa, e depois a medida foi cancelada. Só que extintor de incêndio é um pouco mais grave: deveria continuar como item obrigatório de fábrica. Ou não?

           Lembro que o Contran havia adiado para outubro a exigência de troca do item pelo tipo ABC (carros produzidos desde 2005 já contêm esse tipo de equipamento). Por conta disso, houve correria nas lojas e denúncias de alta nos preços. Alberto Angerami, o presidente do Contran e diretor do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), diz que prorrogação tinha por objetivo dar prazo aos setores envolvidos. "Tivemos encontros com fabricantes de extintores, corpo de bombeiros e a indústria automobilística, que resultaram na decisão de tornar opcional o uso do extintor", afirma. Segundo ele, os fabricantes pediram um prazo maior, de três a quatro anos, para atender a medida. Essa justificativa era dada pelas empresas há 11 anos.  A Associação Brasileira de Engenharia Automotiva informou que dos dois milhões de acidentes em carros cobertos por seguros, apenas 800 tiveram incêndio como a causa.

               O Denatran diz que estudos apontaram que novas tecnologias reduziram muito a chance de incêndio nos carros, entre elas o corte automático de combustível em caso de colisão, a localização do tanque de combustível ficar fora da cabine dos passageiros e os materiais usados nos revestimentos serem quase não inflamáveis atualmente. Você acredita que só foi por isso que o extintor foi extinto em carros?

               É morte ou perda total? Ou ambas? Você decide só na primeira hipótese.,.

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COVARDIA NA HUNGRIA; E NOVA ROTA TEM MINAS*

     
Violência inaceitável contra refugiados: tropas húngaras agridem pais e crianças na fronteira da Sérvia

          Pelo menos 30 imigrantes foram detidos pelas autoridades húngaras durante os confrontos que aconteceram na fronteira com a Sérvia, que foi totalmente fechada com um alambrado de 4 metros de altura e uma barreira espiral de arame farpado no último dia 15. O governo de Budapeste, que também endureceu a leis de migração, alega que prendeu na ação um “terrorista” que teria sido identificado pelos serviços de segurança. A situação esteve mais calma à noite. A representante na Hungria do Alto-Comissário das Nações Unidas para os Refugiados disse estar “angustiada” por “ver pessoas sendo feridas, por ver crianças a chorar porque ficaram separadas dos pais”. Montserrat Feixas Vihé considera que “a violência podia ter sido evitada”.

             Durante a tarde, um grupo de imigrantes começou a atirar garrafas de plástico vazias contra a polícia de choque húngara. A resposta veio desproporcional: muitas bombas de gás lacrimogêneo e borrachadas de cassetete em quem estivesse na frente. A polícia bateu em homens, crianças e mulheres. O secretário-geral das Nações Unidas [ONU], Ban Ki-Moon, considera “inaceitável” a forma como a Hungria está tratando os imigrantes e refugiados. Os confrontos ocorreram no posto fronteiriço que separa Roszke de Horgos, na Sérvia, que foi o principal ponto de passagem para os refugiados até ter sido fechado no início da semana.

             A nova rota migratória desvia-se então pela Croácia. Cerca de 1.300 migrantes entraram ontem no país, provenientes da Sérvia, mas têm que ter cuidado com as minas que restam da guerra dos Balcãs. Zagreb prometeu enviar peritos em desminagem para a região fronteiriça de forma a evitar tragédias. Aos poucos vários países vão fechando as portas. Se a Croácia não quiser absorver ou abrir passagem em seu território aos refugiados, que na maioria buscam a Alemanha, a mais forte economia da Europa, só sobrarão o Mar Egeu, via Turquia, e o Mar Mediterrâneo, via Líbia ou Tunísia. Em ambas as rotas a morte por afogamento tem sido muito comum.

Isso é que é centro-direita
       
Político finlandês oferece sua casa de campo em Kempele a refugiados
       
           A Islândia, com 315 mil habitantes, se dispôs a receber 50 refugiados, número considerado muito baixo, segundo moradores do país, que oferecem até suas casas para abrigá-los. Já a Finlândia, com 5 milhões de habitantes, pretende criar um imposto para receber mais refugiados. O "imposto da solidariedade" vai afetar a camada mais rica da população. O governo de centro-direita do país anunciou que o imposto deve durar dois anos, que prevê um aumento na arrecadação para equilibrar as contas nacionais. Quem ganha mais de 72.300 euros por ano [R$ 310 mil] irá pagar o imposto. Apesar de aumentar as arrecadações, o governo também vai precisar reduzir a ajuda destinada aos refugiados que chegam ao país, passando de US$ 360 [R$ 1,4 mil] para US$ 226 por mês [R$ 881], além de cortar o orçamento de programas sociais.

          O primeiro-ministro finlandês, Juha Sipilä, espera que o país seja um exemplo na crise dos refugiados da Europa. Enquanto muitos líderes do Velho Continente temem o movimento migratório e tentam evitar a entrada dos sírios, Sipilä chegou a oferecer sua própria casa de campo, em Kempele, para abrigar os imigrantes a partir do início de 2016. "Devemos olhar no espelho e perguntar como nós podemos ajudar. Peço que parem com o discurso do ódio e se concentrem em cuidar de pessoas que fogem da zona de guerra, para que se sintam seguras e bem-vindas na Finlândia", disse. [Isso é que é centro-direita, hein!]. O presidente do Banco Central do país, Erkki Liikanen, também anunciou que vai doar um mês do seu salário, cerca de 10 mil euros [R$ 43 mil], aos refugiados.

        *As informações são dos jornais Folha,  Quartz, The Washington Post e The Star.

       Leia mais sobre a crise migratória
       REFUGIADOS: PAÍSES EUROPEUS FECHAM A PORTA

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