sexta-feira, 30 de outubro de 2015

TORCIDA DA LUSA --- HISTÓRIAS DE CAMPANHA

     
Esperidião, deputado federal pelo PP e torcedor do Avai

            As campanhas eleitorais para presidente da República, em geral, atiçam rivalidades partidárias, especialmente quando há segundo turno. Quem não se lembra da disputa Collor x Lula, em 1989. A retomada da vida democrática brasileira foi recebida com paixão pelos novos eleitores, após o fim  da ditadura em 1985, engajados nas campanhas com estrepitosa alegria. Havia carreatas pela capital paulista a qualquer hora, improvisadas pelos próprios cidadãos. Lembro-me como se fosse hoje de um engarrafamento na Avenida Brasil, no sentido Parque do Ibirapuera, com militantes carregando bandeiras dos dois candidatos em carros cheios de gente, numa sexta-feira à noite, isso mesmo, e entoando hinos de campanha. Era o tempo do "Lulalá" e do "Collor aqui". Emparelhados, correligionários dos dois candidatos brincavam sem agressões, xingamentos, sem brigas. Era uma entusiasmada redenção democrática, Não havia o ódio e o desrespeito que existem hoje, nem a intolerância e a agressividade que transforma  adversário no voto em inimigo a ser eliminado, e muito menos gente gritando nas ruas pela volta dos militares. Havia apreço pela democracia reconquistada duramente pelos movimentos sociais. Ainda não havia também o desencanto e o desprezo com os políticos.

           Pois bem, em 1994, segunda eleição direta para presidente do Brasil depois do regime militar, eu estava encarregado, no primeiro turno, de acompanhar Esperidião Amin, candidato pelo Partido Progressista Renovador [PPR], sempre que ele estivesse em São Paulo. Descendente de libaneses, Amin -- formado em administração e direito, casado com Ângela Amin, e pai de três filhos -- é um homem inteligente e com senso de humor apuradíssimo. Quem o conhece pessoalmente sabe disso. É preciso dizer que apesar de ter densidade eleitoral bem menor que os rivais de urna e vindo de um Estado com relativa importância econômica para o país, ele não integrava o que os repórteres da editoria de política da "Folha" costumavam chamar, na gozação, do MSL, o "movimento dos sem lide" -- aquele político que fala, fala, fala e não dá uma manchete de jornal. Amin estava bem longe disso.

         Com traço ou menos de 1% dos votos nas pesquisas eleitorais, Amin situava-se na faixa dos chamados candidatos nanicos e se viu de repente acusado, no mínimo, de sonegação fiscal. Rivais liberais de Santa Catarina trataram de minar sua candidatura com denúncias e desta vez ele não se saíra bem. Não soube explicar a supervalorização de um terreno por ele comprado e vendido a Ângela Amin em 1979. Também não soube dizer para onde foram Cr$ 720 mil [a moeda de época era o cruzeiro], obtidos por Ângela junto à Caixa Econômica de Santa Catarina como empréstimo para pagamento do terreno e da construção de uma casa. A casa não existia nem nunca existiu. O terreno foi comprado por Cr$ 25 mil em 18 de janeiro de 1979 e vendido em 26 de janeiro do mesmo ano por Cr$ 300 mil. Uma valorização incrível em apenas 7 dias. Ângela, segundo sua assessoria, disse que fez o financiamento para pagar dívidas particulares e negou que o terreno estivesse supervalorizado.

         A entrevista que fiz com o candidato sobre a denúncia aconteceu de modo inusitado, para mim. O candidato acabara de deixar o estúdio de gravação do programa eleitoral na TV, na Vila Leopoldina, zona oeste de São Paulo, e iria fazer campanha de rua no Largo 13, área de comércio popular na zona sul. Ele colocou os assessores no banco traseiro e dirigindo o carro me deu entrevista no trajeto. Me fez rir muito com ótimas tiradas, mas poucas justificativas. Foi quando resolvi mudar o tom de uma pergunta. Afinal por que um político como ele -- com muita força regional e que sabia que não iria para um eventual segundo turno -- insistia em ser candidato a presidente? Eu ainda argumentei: "A sua candidatura parece a torcida da Portuguesa. Não aparece nas pesquisas!". Os assessores ficaram sem graça, mas ele riu bastante com a minha opinião e disse: "Escreve aí, eu vou estar no segundo turno!" Estranho seria mesmo se ele dissesse o contrário. Chegando ao Largo 13, um carro de som com bandeiras do candidato e meia dúzia de correligionários já o aguardavam. De repente, durante a caminhada pelo calçadão, a cada pessoa que declarava intenção de votar no candidato, Esperidião Amin me chamava e, mesmo à distância, dizia rindo: "Olha aí, George Alonso, mais um torcedor da Portuguesa!"
        Surpreendente, a atitude do candidato me fez rir a cada nova declaração de voto.

        PS --  Em 1994, o desempenho de Amin foi mesmo digno de um candidato nanico. Ele ficou em 6º lugar na corrida presidencial, com 1,7 milhão de votos [2,7% dos válidos], atrás de FHC [eleito no primeiro turno com 34,3 milhões de votos, 54,2%], Lula [em segundo lugar com 17, 1 milhões de  votos, ou 27%], Eneas [em terceiro lugar com 4,6 milhões de votos, 7,3%]  Orestes Quércia  [em quarto lugar com 2,7 milhões de votos, 4,3%] e Brizola [em quinto lugar com 2 milhões, 3,18%]. Esperidião Amin perdeu? Não, ele tinha cumprido sua missão, que era usar a candidatura a presidente para alavancar sua popularidade em Santa Catarina, onde se elegeria governador em 1998. Hoje é deputado federal e foi recém-eleito presidente catarinense do Partido Progressista.


Leia outras histórias de campanhas
SAMBA NO PÉ - COVAS NA ROSAS DE OURO

AUSÊNCIA SENTIDA - MALUF NO PALMEIRAS


[se gostou, compartilhe ou dê "share"]

Nenhum comentário:

Postar um comentário